São Paulo, sexta-feira, 08 de agosto de 2008

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criador e criatura

Ícone do cinema de horror, José Mojica Marins, 72, lança filme hoje e aponta Dennison Ramalho, 34, como sucessor

Filme une "mentes diabólicas

" Criador do Zé do Caixão, que vive em busca do "herdeiro perfeito", apadrinha curtametragista gaúcho

Dennison Ramalho, 34, é fã de Mojic desde a infância e co-assina com o diretor o roteiro de 'Encarnação Demônio', que estréia hoje


Eduardo Knapp/Folha Imagem
Dennilson Ramalho (à esq.) e José Mojica Marins 'assustam' um ao outro, no centro de SP

SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL

Na tela, Zé do Caixão segue em busca do herdeiro perfeito em "Encarnação do Demônio", que estréia hoje nos cinemas.
A saga começou em 1964, com "À Meia-noite Levarei sua Alma", que lançou o personagem do coveiro exterminador.
Fora da tela, o diretor do filme, autor e intérprete de Zé do Caixão, José Mojica Marins, 72, definiu o seu sucessor no terreno do cinema de horror.
O apadrinhado de Mojica é Dennison Ramalho, 34, co-autor (com o cineasta) do roteiro de "Encarnação do Demônio" e diretor de dois curtas de horror, "Nocturnu" (1998) e "Amor Só de Mãe" (2002).
"Ele tem uma mente criativa, uma mente diabólica. É mais ou menos aquilo que encontrei na Espanha, o [pintor surrealista] Salvador Dalí... Bem loucão. Ele é o Salvador Dalí reencarnado", afirma Mojica.
Ramalho dedicou seu primeiro filme a Mojica. "Acho que isso me deu sorte. Ganhei os prêmios de melhor curta e melhor diretor no Festival de Gramado, uma coisa que nunca tinha imaginado", diz.

Unhas grandes
Com o impulso dos prêmios, o diretor gaúcho se mudou para São Paulo, para "filmar mais", e aproximou-se do ídolo que arrancara seu sono, na primeira vez em que o avistou.
"A molecada na escola falava que existia um tal Zé do Caixão, um cara que tinha as unhas grandes", lembra Ramalho. O estudante tinha apenas cinco anos de idade quando assistiu na televisão ao "Show do Outro Mundo", de Mojica.
"Fiquei cinco dias dormindo de porta aberta, com a luz do corredor acesa, absolutamente aterrorizado", diz Ramalho. As noites insones seriam sua primeira afinidade com o mestre.
"Sofro de uma insônia fantástica. Comecei a tomar sonífero aos 18 anos. Mas tenho um aliado muito grande -o pesadelo. Só tenho pesadelos. É minha maior inspiração, porque só vêm coisas bizarras, que fogem à imaginação do homem comum", afirma Mojica.
Na adolescência, Ramalho começou "a caçada pelos filmes" de Mojica. Em 1995, veio a São Paulo, tentar obtê-los pessoalmente com o diretor. Tornaram-se amigos.
"Eu não sei falar em "americano". O Dennison passou a ser o meu tradutor", diz Mojica, cuja versão "para exportação", Coffin Joe, ganhou relevo fora do país, enquanto aqui o diretor vivia anos de ostracismo.
O mais significativo projeto de Mojica a adormecer na gaveta era o roteiro de "Encarnação do Demônio", escrito em 1966, para dar seqüência à história de Zé do Caixão.

Condição
Ver o filme realizado era um sonho de Ramalho e também do diretor e montador Paulo Sacramento. Juntos, os dois decidiram levá-lo adiante, com uma condição: Mojica deveria interpretar Zé do Caixão.
O diretor planejava entregar o personagem a outro ator, para não ter de envelhecê-lo. "Devo ao Dennison essa idéia que tivemos de deixá-lo 40 anos na prisão, para sair envelhecido", diz Mojica, citando o ponto de partida de "Encarnação do Demônio", quando Zé do Caixão ganha de novo a liberdade.
A partir daí, o coveiro retoma sua busca pela "mulher superior" e impõe cruéis torturas aos desafetos e traidores.
Ramalho diz que havia "vários caminhos" possíveis a seguir no roteiro. Ele sugeriu um. "Cheguei para o Mojica e falei: os fãs adoram violência pesada e tortura; eu adoro violência pesada e tortura; você adora violência pesada e tortura. Vamos nessa e vamos ser mais malignos do que os que estão fazendo isso hoje."

Erotismo e terror
Mojica não imaginava mesmo fazer mudanças em sua velha fórmula. "Acho que não existe nenhum filme de terror que funcione se não casar erotismo com terror", afirma.
O erotismo, nesse caso, é a subjugação da mulher, de acordo com o gosto "sádico" do público, conforme afirma Mojica.
"Queira ou não, sem mulher o povo não vai ao cinema. Todos têm um pouco de sadismo, porque todo mundo quer ver a mulher ser torturada. Para valer, o filme tem que ter a bela e a fera. Não adianta pôr um homem bonito para fazer essas coisas com uma mulher. O povo não aceita", diz o cineasta.


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