São Paulo, sexta-feira, 08 de dezembro de 2000

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Baseado em fábula infantil, "O Grinch" chega à telona personificado por Jim Carrey

Papai Noel: procura-se
Divulgação
O ator Jim Carrey no papel de Grinch, personagem criado há 53 anos e que odeia o Natal



Ator teve aulas com agente da CIA para lidar com a sensação de tortura produzida pela maquiagem

MILLY LACOMBE
ESPECIAL PARA A FOLHA, EM LOS ANGELES

O antiPapai Noel chegou. Ele é verde, odeia o Natal, não suporta crianças, despreza presentes, é rabugento e você vai adorá-lo.
Grinch, o personagem criado há 53 anos por Theodor S. Geisel, mais conhecido como dr. Seuss, virou filme protagonizado por Jim Carrey -e ganhou as páginas dos cadernos de economia esta semana depois de virar piada na rede CNBC, que comparou Grinch ao presidente do Banco Central norte-americano, Alan Greenspan, que anunciou medidas interpretadas como uma forma de roubar o espírito do Natal, a exemplo do que tenta fazer o personagem de Carrey.
O ator fez questão de lutar pelo papel de Grinch. Durante as filmagens de "O Mundo de Andy", fez o teste. Só havia um pequeno problema: para viver o comediante Andy Kaufman, em "O Mundo de Andy", Jim Carrey havia decidido ficar no personagem 24 horas por dia.
"Portanto, quem fez o teste foi Andy, fazendo sua interpretação de Carrey interpretando o Grinch", disse Carrey à Folha. "Andy fez um bom trabalho, e eu consegui o papel. Para mim, foi como uma manhã de Natal."
Mas a alegria não durou muito. Por causa da roupa verde peluda, da máscara que não o deixava respirar e da lente de contato que arranhava sua córnea, ele pensou em desistir. "Eu estava sendo torturado oito, dez horas por dia." A solução: levar para o set um agente da CIA especializado em fazer militares lidarem com torturas. Carrey foi treinado e acabou conseguindo superar os três meses de agonia.

Folha - Os brasileiros desconhecem o Grinch. Quem é ele?
Jim Carrey -
Grinch é a alienação. Ele é aquela parte de todos nós que, no Natal, se sente isolada, sozinha. Ele é aquela fase de nossa vida em que fomos discriminados. É por isso que as histórias de dr. Seuss são clássicas e importantes para adultos e crianças.

Folha - Você já se sentiu isolado?
Carrey -
Muitas vezes. Eu me senti assim quando cheguei a Hollywood vindo do Canadá, onde nasci. Ou quando os meninos da minha idade jogavam bola, e eu ficava ensaiando piadas para meus pais rirem. Por isso entendo o Grinch e sei que, se houver alguém disposto a nos dar a mão, todos podemos ser ajudados.

Folha - Como foi a experiência de vestir aquela roupa e a máscara?
Carrey -
Foi a mais dramática de toda a minha vida. Eu ficava de três a cinco horas na cadeira de maquiagem todos os dias. A máscara não me deixava respirar, e eu tinha uma sensação claustrofóbica. Fora a lente de contato, que cobria todo o meu globo ocular e eu mal conseguia enxergar. A dentadura não me deixava falar, a máscara prendia minha pele.
Aí trouxeram um agente da CIA para me treinar a suportar a dor. Foi incrível. Aprendi que é uma simples questão de foco. É só desfocar a dor e manter as coisas boas em perspectiva. Foi fascinante.

Folha - Você acha que a Academia e Hollywood sabem apreciá-lo como comediante, mas não como ator dramático?
Carrey -
Não me importo muito com o que eles acham. Mas quero me estabelecer como ator dramático também, porque a arte está em ter a chance de fazer ambos. Quando fiz "O Show de Truman", tive de tirar camadas. Em "O Grinch", tive de acrescentar camadas. E isso me intriga: trabalhar as duas coisas.
Meu próximo filme é um drama que fala sobre a importância dos sonhos em nossas vidas. Espero conseguir continuar alternando os dois gêneros. Se prêmios virão, não me interessa. Eu faço a comida e a coloco na mesa. Quem quiser comer que coma (risos).

Folha - Sua veia cômica não seria seu lado mais forte?
Carrey -
No começo, precisava me sentir especial. E o começo a que me refiro é a minha adolescência. Por isso eu fazia questão de entreter minha família. Passava dias me preparando, e a noite de Natal era a noite do Jim Carrey Show. Eu precisava saber que era especial. Agora já não sou mais assim, sei que sou absolutamente desnecessário em termos cósmicos. O universo não precisa de mim. Isso me libertou.

Folha - Alguns atores não assistem a seus próprios filmes. Você é assim?
Carrey -
De jeito nenhum. Eu preciso me ver na tela. Vou contar um segredo: eu me escondo nos cinemas para ver o público reagir a meus filmes. Faço isso há anos.

Folha - Você sempre quis ser famoso?
Carrey -
Sempre. Tudo o que aconteceu na minha vida foi por mim visualizado na infância. Eu acredito em milagres, acredito que, se compartilharmos nossos sonhos, existem forças que trabalharão para que aconteçam.

Folha - Esse filme critica a comercialização do Natal e, ao mesmo tempo, vai faturar milhões exatamente por causa do Natal. Como você vê isso?
Carrey -
Esse é um filme que transcende a comercialização do Natal. É uma história sobre a intolerância.

Folha - Imagino que seja extremamente difícil para você lidar com você mesmo.
Carrey -
Você não imagina como (risos). É por isso que leio três ou quatro livros de auto-ajuda de uma vez. Sou fascinado por esse tipo de livro. Leio uns 20 por ano.

Folha - Onde você quer chegar?
Carrey -
Busco o equilíbrio. Faço ioga, medito, estou em uma dieta de desintoxicação. A excitação é inimiga do equilíbrio espiritual. Estou aprendendo a me controlar para ser uma pessoa mais equilibrada. Quem se deixa levar pelo ego não chega a lugar nenhum.

Folha - O que faz você rir?
Carrey -
Um bom tombo, alguém que faz uma besteira tremenda, minhas besteiras. Não rio com piadas, rio de situações.

Folha - Qual a sua cor preferida?
Carrey -
Verde. Verde é vida.


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