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Crítica/"A Troca"
Eastwood nocauteia público com melodrama ácido e eficaz
Diretor faz polícia, política e medicina terem o peso de monstros de filmes de terror
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
Quem se dispõe a pagar
cerca de R$ 20 para
pouco mais de duas
horas num cinema espera em
equivalência uma boa história,
se possível bem contada.
"A Troca" oferece isso em
justas proporções. Como se trata de um título com direção de
Clint Eastwood, quem também
quer que filmes contem mais
que histórias pode encontrar o
que procura.
A lista de apelos de "A Troca"
não é pequena. Tem Angelina
Jolie maquiada com batom vermelho flamejante como mãe
sofredora e mulher sacrificada,
num papel talhado para o Oscar
de melhor atriz. Uma esplendorosa recriação de época que reconstitui a Los Angeles dos
anos 20. Uma história emocionante até os ossos sobre crianças desaparecidas, corrupção
pública e embates pela justiça
em cenas de tribunal. A eficácia
dramática de situações "baseadas em fatos reais" cuja função
é satisfazer um público que
quer "veracidade". E o maestro
Eastwood regendo tudo com
sua inconfundível vocação de
provar que clássico é sinônimo
de eterno.
Em comparação com as alturas épicas alcançadas pelo diretor no díptico "A Conquista da
Honra"/"Cartas de Iwo Jima"
(2006), "A Troca" pode até parecer "menor", algo como um
"filme de mulher" dos anos 40,
daqueles que converteram Ingrid Bergman, Bette Davis e
Joan Crawford em mitos. E é
assim que Eastwood demonstra uma de suas astúcias.
Sensibilidade
O personagem durão de suas
encarnações como ator confundiu a recepção de sua obra
como diretor, impedindo que
se visse o alcance de sua sensibilidade de cineasta. Desde
"Bird" (1988) e, sobretudo, "As
Pontes de Madison" (1995), essa faceta se tornou mais evidente, e com ela os papéis femininos ganharam espaço numa
filmografia até então predominantemente masculina. Com
as mulheres ele encontrou o
melodrama, gênero cujos códigos nem disfarçam críticas poderosas, histórias de abusos
nas quais, com frequência, a sociedade exibe o que tem de
pior.
É nesse sentido que "A Troca" pode ser entendido como
veículo. Em vez de servir apenas para Angelina Jolie levar
para casa seu Oscar máximo, o
filme explora a adesão do público à imagem da estrela para
construir em torno dela uma
ácida representação da corrupção, na qual a polícia, a política
e a medicina ganham o peso de
monstros de filmes de terror.
Neste avesso de "mundo perfeito", o quase octogenário
Eastwood demonstra que
quanto mais vive mais desenvolve a habilidade de nos nocautear com uma sucessão de
porradas.
A TROCA
Produção: EUA, 2008
Direção: Clint Eastwood
Com: Angelina Jolie, John Malkovich
Onde: estreia hoje nos cines Cidade
Jardim, Metrô Tatuapé e circuito
Classificação: não indicado a menores de 16 anos
Avaliação: ótimo
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