São Paulo, segunda-feira, 09 de fevereiro de 2004

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"Fala Tu", documentário sobre três rappers cariocas, ganha boa recepção em Berlim

Morro que rima

Divulgação
Cena de "Fala Tu", documentário de Guilherme Coelho que aborda o hip hop no Rio de Janeiro


FABIO CYPRIANO
ENVIADO ESPECIAL A BERLIM

O cinema brasileiro começou bem em Berlim. "Fala Tu", de Guilherme Coelho, primeira produção exibida na 54ª edição do festival alemão, na última sexta, praticamente lotou os 400 lugares da sala onde foi exibido, ganhou aplausos respeitosos e manteve a maioria da audiência no debate com o diretor e o roteirista, Nathaniel Leclery, que ocorreu por volta da meia-noite. Tenso, o diretor não permaneceu na sala durante a sessão.
"Fiquei muito mais nervoso do que havia programado", comentou no início do debate. Segundo Wieland Speck, responsável pela sessão Panorama, da qual o documentário participa, "Fala Tu" mostra um diferencial em relação às recentes produções brasileiras.
"Assisti ao filme no Rio e o selecionei, pois ele não aborda a violência da forma como estamos acostumados a ver ultimamente nos filmes do país. Além do mais, ele apresenta a história de seus personagens e de como eles constroem seu próprio espaço, mesmo sem dinheiro, com muito orgulho", disse o diretor do festival à Folha, após o debate.
Para o Panorama, Speck selecionou ainda "Contra Todos", de Roberto Moreira, que será exibido hoje, e "O Outro Lado da Rua", de Marcos Bernstein, ambos com estréia mundial em Berlim, ao contrário de "Fala Tu", que participou de mostras no Rio, São Paulo e Miami e deve estrear no Brasil no dia 2 de abril. Os filmes exibidos na sessão Panorama concorrem apenas ao prêmio do público.
"Fala Tu" apresenta o cotidiano de três moradores da periferia carioca ligados ao rap: Macarrão, Toghum e Combatente. A princípio, o documentário pretendia apresentar o rap carioca, mas, segundo Leclery, o lado pessoal dos personagens acabou ganhando maior foco durante a preparação para as filmagens.
"Após oito meses de pesquisas, percebemos que se fôssemos contar a história do rap, o documentário acabaria ficando muito tedioso. Há um discurso "pop-marxista" entre os rappers que é muito genérico e percebemos que mostrar o cotidiano das pessoas que conhecemos seria muito mais interessante", afirmou o roteirista durante o debate. "Obrigado por isso", gritou uma alemã, após a resposta.
O que une os protagonistas da produção é o universo musical -todos são rappers-, mas cada um com uma história bastante particular. Macarrão, 33, recebe apostas para o jogo do bicho, no bairro do Estácio, enquanto Toghum, 32, filho de um sambista carioca que abandonou a família, dedica-se ao budismo e tenta estudar jornalismo em uma universidade. Finalmente, Combatente, 21, a mais engajada politicamente, dedica-se à igreja do Santo Daime e torna-se desempregada durante o documentário.
Mesmo sem ter estreado no Brasil, a produção já fez com que seus protagonistas tivessem suas vidas transformadas. "Macarrão foi indicado para escrever uma "sitcom" e se revelou o mais capaz, e Toghum ganhou uma bolsa de estudos em uma universidade. Agora, estamos tentando que ele se encontre com o Lula, pois ele também quer ser o primeiro porta-voz negro de um presidente", disse Coelho.
Além dos filmes do Panorama, o Brasil ainda está presente na sessão denominada Mercado -exibições para distribuidores-, na qual diversas produções ainda inéditas no país são exibidas. Na última sexta, foi a vez de "Nina", primeira produção de Heitor Dhália. Segundo o diretor estreante, o filme chegou embalado pela boa repercussão no Festival de Roterdã, encerrado recentemente. "Um dos jornais holandeses nos colocaram na lista dos melhores cinco filmes da mostra", disse Dhália, em Berlim. 2004 parece ser um ano que vai marcar o cinema nacional.

Fabio Cypriano viajou a convite do Instituto Goethe de SP e do festival. Pedro Butcher viajou a convite do festival



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