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NINA HORTA
Surpresas de aniversário
Vamos falar de presentes
de aniversário. O pai de minha cunhada, numa época da vida, resolveu esta chatice de ficar
descobrindo o que poderia agradar ao outro, que tipo de livro,
que tipo de xampu, que tipo de
chinelo. Dava comida. Comida
crua, mesmo, um belo bacalhau,
um cupim, pêssegos no auge, e o
sucesso era certeiro.
Pois também ganhei presentes
de comer e de beber e outros que
não cabem na página.
Um amigo me mandou uma cachaça maravilhosa. Ele virou cachaceiro (alguns dizem cachacier,
mas tenha paciência) já há algum
tempo, e desde o primeiro gole fiquei de cabeça enluarada.
"Estou mandando pelo chofer
uma cachaça muito especial, julgada pelos especialistas a melhor
de todas elas. Explico logo que
não a fabriquei e não tenho nenhum mérito na sua qualidade.
Tudo o que fiz foi comprar, lá em
Salinas, seguramente o melhor
terroir de aguardente do Brasil,
uma dorna (barril) do dono da
Lua Cheia, guardada por mais de
12 anos, e engarrafar o seu limitado conteúdo. Portanto, não existirá outra "Enluarada" -é só essa
partida e nada mais. Devo dizer
que a cachacinha é unanimidade
nacional: todo mundo que já tomou diz que é a melhor já provada. Acho que tive muita sorte. Como a Havana/Anísio Santiago, é
engarrafada com cinco anos e
meio (50% seis anos mais 50%
cinco anos), e como essa propriedade é quase vizinha da Havana e,
ainda, como a Lua Cheia sempre
foi considerada a vice-melhor,
ocorreu que esse "vat", provavelmente devido ao longo envelhecimento, tinha uma cachaça maravilhosa.
Um dia desses conto mais histórias de Salinas e já acrescento que
a Anísio Santiago (Havana) não
só é a melhor cachaça no comércio (grand cru hors classe) como
merece ser. Você não imagina a
perfeição, o capricho e a limpeza
do sítio onde é fabricada."
Sorte tive eu, que não conheço
Salinas, mas gosto de cachaça
boa, que veio ter à minha porta
sem precisar de grandes viagens
neste calorão infernal...
A amiga perfeccionista e generosa trouxe um festão, até cajuína,
passando por um bolo de morangos e um Prosecco, e um pão com
receita, que fez o maior sucesso.
Podem pular a leitura e recortar
para o dia que quiserem assar um
gostosíssimo pão. "Numa bacia,
coloco 15 g de fermento fresco e
três colheres (sopa) de açúcar.
Misturo bem, junto três xícaras de
água morna, uma colher (sopa)
de sal, meia xícara de manteiga,
um ovo e farinha de trigo aos poucos. Vou mexendo com colher de
pau e depois uso as mãos. Vou colocando mais farinha até conseguir sovar a massa, sem que ela fique grudando (vai cerca de 1 kg de
farinha). Sovo uns dez minutos.
Junto à massa uma xícara de castanha-do-pará triturada grosseiramente. Cubro a massa com pano e espero dobrar de volume. Divido em três porções, moldo os
pães e coloco em forma untada e
enfarinhada. Quando estiverem
crescidos de novo, levo ao forno
preaquecido bem quente por dez
minutos. Abaixo o fogo e deixo
assar por mais 50 minutos. Pronto, é só comer."
E comemos dois pães inteirinhos na mesma hora, ainda bem
quentes, com uma manteiga boa,
ai, ai, ai.
O Viajante mandou um presente de "descomer", chegou de Barcelona com uma figurinha de presépio que eu havia muito tempo
queria ter, uma miniatura do "caganer", que não se acha em parte
nenhuma da iconografia cristã,
mas só na escatologia catalã, em
que é aceito nos presépios com a
maior naturalidade. Olhem a descrição do crítico Robert Hughes,
no livro "Barcelona": "Com o gorro vermelho, a barretina, enterrado na cabeça, o homenzinho está
de cócoras, com as calças arriadas, e de seu traseiro nu sai um
pedacinho de cocô castanho,
unindo-o à terra. Ele é o fecundador imemorial...". Miró o pintou
no quadro "A Quinta, Montroig".
Olhem lá, bem num cantinho,
perto da mãe que lava roupa.
O Crítico mandou algas e doces
deliciosos do Japão. Hão de adivinhar que a surpresa maior de aniversário, o deslumbramento total,
para falar a verdade nua e crua, foi
o seguro-saúde, que dobrou!
Agora, depois de velha, passei
mil anos sem ir ao médico e vejam
o que aprontaram... Desculpe,
Viajante, mas vou enrolar aquele
"caganer" tão bonitinho e mandar para a Omint, com meus agradecimentos.
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