São Paulo, quinta-feira, 09 de maio de 2002

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Mostra celebra um século de bom desenho

FRANCESCA ANGIOLILLO
DA REPORTAGEM LOCAL

No ano em que morreu, 1971, o dinamarquês Arne Jacobsen deu uma entrevista ao jornal "Politiken" em que contava que, quase toda vez que projetava um edifício, críticos queriam "mandá-lo direto para o inferno".
Em seguida, porém, emendava sua explicação para o fato: "A crítica quase sempre ocorre quando algo novo aparece".
Uma olhada nos objetos, móveis e reproduções de desenhos expostos no Instituto Tomie Ohtake a partir desta noite permite arriscar um palpite: o contraste entre linhas retas, na arquitetura, e as formas orgânicas, nos objetos de design, pode ter causado estranheza entre os contemporâneos de Jacobsen.
A mostra "Arne Jacobsen no Século 21: Um Moderno Clássico -0Um Clássico Moderno" é parte das comemorações do centenário do arquiteto e designer, iniciadas em fevereiro na Dinamarca, com ramificações por várias países e apoio das embaixadas e do Dansk Design Center (Centro Dinamarquês de Design, DDC).
Aqui, a curadoria é da arquiteta Fernanda Machado, 31, espécie de seguidora de Jacobsen -complementou sua formação na mesma escola em que ele estudou e lecionou em Copenhague, a Academia Real de Belas Artes da Dinamarca, e trabalhou no escritório de seus sucessores profissionais.
Da experiência dinamarquesa, Machado tirou lições que podem servir como pistas para compreender o que origina a tão propalada excelência escandinava no campo do design.
"Eles buscam o essencial. Até para conversar, se tem de arrancar as coisas deles", comenta a curadora, que ressalta a atenção quase obsessiva dos conterrâneos de Jacobsen com os detalhes.
Alie-se a isso uma tradição de artesanato de alta qualidade e uma crença de "quem faz bem feito faz uma vez só" (frase que, diz Machado, os dinamarqueses usam como um bordão) e você começa a entender por que um projeto de 50 anos atrás pode durar até hoje.
Muito estudo para chegar a um resultado "simples": é isso que escondem cadeiras minimalistas como a "Ant" (formiga) ou as suas "primas" da "Série 7".
Os móveis em madeira laminada -técnica de dobragem do material em que os nórdicos são especialistas- ocupam as duas salas do térreo do instituto reservadas à exposição, ao lado de outros móveis, como a poltrona "Egg" (ovo) ou a linha "Swan" (cisne).
Na primeira sala, o visitante é convidado a imergir no "mundo" de Jacobsen; uma linha do tempo cruza seus dados biográficos e fatos do contexto histórico que o tenham influenciado.
O aspecto desse primeiro espaço é mais contemplativo; estão nele as cadeiras laminadas, miniaturas de móveis, numa vitrine. Um vídeo coleta depoimentos sobre sua obra -característica de todas as exposições do centenário, promovendo o que a curadora chama de "debate mundial".
Na segunda sala, estão móveis que podem ser usados, tocados, configurando um espaço em que o visitante pode "comprovar" as habilidades de Jacobsen.
Uma linha mestra para a concepção da mostra é o projeto do SAS Royal Hotel, obra que Fernanda Machado considera a mais "emblemática" de Jacobsen.
Faz sentido. O arquiteto aceitou o projeto do hotel em Copenhague com a condição de responder por tudo: do prédio aos móveis, talheres, luminárias e até mesmo à padronagem das cortinas.
Entre os desenhos originalmente criados para o SAS Royal, estão a poltrona "Egg" e os talheres afilados da primeira sala -concebidos em 1958, eram tão futuristas que seriam usados em "2001 -°Uma Odisséia no Espaço", de Stanley Kubrick, dez anos depois.
Vale dizer, por fim, que os nomes dos móveis não vêm do nada.
É nas formas naturais que o design de Jacobsen busca inspiração -ou coisa que o valha. Para Jacobsen, inspiração era observação: "É quando você chega em casa e lhe perguntam: "Você achou a inspiração?". E, felizmente, você não achou. Mas as impressões estão lá e, certamente, podem emergir mais tarde".


ARNE JACOBSEN NO SÉCULO 21: UM MODERNO CLÁSSICO - UM CLÁSSICO MODERNO - projetos e objetos de design do arquiteto dinamarquês (1902-1971). Curadoria: Fernanda Machado. Onde: Instituto Tomie Ohtake (av. Faria Lima, 201, SP, tel. 0/xx/11/6488-1900). Quando: hoje, às 19h (para convidados); de ter. a dom., das 11h às 20h. Até 7/7. Entrada franca.



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