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RITA LEE ACÚSTICA
Cantora prepara seu "Rock'n'Nova"
da Reportagem Local
Adepta ferrenha da Internet como meio de comunicação, Rita
Lee falou à Folha em quatro baterias de perguntas e respostas por
e-mail -quase sempre respondidas por volta das 5h-, mais um
encontro numa sessão de ensaios
de seu acústico, em São Paulo.
Além do projeto da MTV, Rita
prepara com Antônio Bivar a volta
do programa radiofônico "Radioamador" e quer interpretar
Evita Perón em filme do amigo Patrício Bisso ("só falta a grana").
A seguir, a cantora e compositora paulistana fala sobre o acústico,
sobre sua "recém-conquistada
caretice" e sobre como é envelhecer no palco do rock'n'roll.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
Folha - O show e o disco "Bossa'n'Roll" (91) deram partida a
uma série de projetos acústicos.
Há algo ainda a ser acrescentado
ao formato, sete anos depois?
Rita Lee - Na época, tudo foi
bem mais radical. Era um banquinho, um violão e nada mais. Acreditei em João Gilberto quando ele
disse que eu sou uma roqueira
com voz de bossa-novista, então
resolvi "namorar" Nara Leão.
Hoje diria que estou um passinho
adiante, em termos de instrumentação, do "Bossa'n' Roll". Talvez
um "Rock'n'Nova"...
Folha - É continuidade, e não novidade, então?
Rita - Não me preocupo em
inovar aos 30 anos de carreira, mas
acho que poderíamos dizer que
não se trata de continuidade, uma
vez que o básico de tudo mudou.
Consideremos novidade, sim, afinal nunca me apresentei com arranjos tão diferentes. Esta formação de banda é a primeira vez que
monto, isso não é considerado novidade? Tudo bem... Chama Memê
e radicaliza a véia no jungle...
Folha - O formato acústico não
estaria já se tornando repetitivo?
Rita - Não acho. Acústicos se
tornaram uma fórmula de apresentar o artista de uma maneira
mais despojada e, portanto, mais
intimista. Cada artista tem uma
concepção desse despojamento
dos acústicos. Gostaria de ver como o Sepultura faria o dele. Quem
sabe só raspariam os cabelos...
Folha - A blague de "tia do rock"
ainda continua valendo?
Rita - Essa coisa de tia vejo como uma homenagem ao meu pioneirismo como a roqueira brasileira que ainda tinha cara de bandida.
Você ainda me chama de titia
quando eu já sou vovó?
Folha - Como assim?
Rita - Sim, sou uma feliz vovó
Ritinha. Ganhei uma netinha de 3
anos que se chama Nina, filha de
Júlia, namorada do meu filho Beto, com um cara que sumiu. Acho
que nem precisamos entrar em detalhes, é minha neta e ponto final.
Nem tentem tirá-la de mim.
Folha - Aos 50 anos, a roqueira
Rita Lee ainda é roqueira? É espontâneo tocar rock'n'roll para sempre ou o banquinho e o violão passam a ficar mais atraentes?
Rita - Aos 50 anos, não há rótulos pessoais prediletos. As modas
passam cada vez mais rápido, nem
dá tempo de mandar ninguém à
fogueira. Os tais 15 minutos de sucesso são ótimos, aplico-os em
mim mesma.
Não tenho nenhum exemplo de
mulher roqueira cinquentona
compositora e na ativa para me espelhar. Modestamente, sou a única do planeta. Tina Turner não vale, não é compositora. Cher não
vale, é dondoca. Restam os rapazes, Chuck Berry, Erasmo, Stones,
Bowie, Lou Reed, Iggy Pop...
Vou repetir a piada: tenho 50
anos, corpinho de 17 (1m70, 49kg)
e cabeça de 2001, uma odisséia no
espaço. Pode vir rock, bossa, bolero, metal, mambo, tecno que a
véia traça. Só não tenho chances
com o Tchan por falta de talento
básico, a bunda avantajada.
Adoro shows pauleira, perco
dois quilos por apresentação. Seguro numa "nice". O único que
costumava reclamar era meu fígado, mas, com minha recém-conquistada caretice, nem ele.
Folha - Por que astros pop vivem
dizendo que ficaram caretas?
Rita - Alguns seres humanos ficam caretas por opção, e não por
culpa. O replay do mesmo filme
esgota. Também não suporto discursinhos moralistas dos "regenerados", acho um desserviço à
informação "droguística" honesta. O pior careta é o ex-louco arrependido. A quem nunca foi viciado pode parecer nhenhenhém,
mas não é. Atire a primeira pedra
quem nunca sofreu numa dietazinha para emagrecer. Outros artistas continuam no mesmo filme
-se a arte deles está bacana, empapucem-se.
Folha - Sua carreira não chegou a
espelhar certa crise entre a "eterna
juventude" do rock e a "juventude
não eterna" da realidade? O rock
não é cruel com o envelhecimento
dos roqueiros?
Rita - Francamente, se me cobrarem juventude eterna, estarão
perdendo tempo. Envelhecer sendo uma serena e sábia feiticeira é
bem mais eficiente que ter morrido jovem, burrinha e perua.
Folha - Quanto de seu tempo
tem sido dedicado a ensaios?
Rita - Estamos ensaiando uma
média de oito a dez horas por dia.
Começamos há dois meses. Primeiro eu sozinha, pelada no banheiro com meu violão, depois
Roberto me passou harmonias
mais elaboradas. Aí entrou Beto,
formando o Pai, o Filho e a Espírita
Santa. Depois veio Lee Marcucci,
ex-Tutti Frutti, e os três mosqueteiros viraram quatro.
Estamos formatando o repertório, muitos arranjos que permanecem impregnados precisam de
tempo para serem transformados.
Nesses casos, é bom nem ouvir os
originais. Mudar arranjos é fundamental para uma boa oxigenação.
Folha - Você já afirmou que a
música não ocupava mais parte
predominante da sua vida e agora
fala de ensaios de dez horas por
dia e do prazer de cantar provocado pelo projeto. Houve uma perda
de prazer, há uma recuperação?
Rita - Devo ter falado essa mentira para os críticos terem algum
motivo mais consistente quando
baixarem o cacete em mim. Música é terapia, se ficar sem ela um
dia, morro de tédio. O prazer pelo
som nunca se perdeu, a saúde passou por sérios problemas que já foram recuperados, estou nos trinques.
Folha - O modelo "acústico com
convidados" será mantido?
Rita - Acho simpático. Nunca
tive o prazer de cantar com Milton
Nascimento, vamos fazer juntos
"Mania de Você", com um arranjo bem bonito e diferente do que já
foi feito. Cássia Eller vai cantar
"Luz del Fuego", Ed Motta, "Caso Sério". Gostaria muito que Marina Lima topasse participar, mas
anda reclusa em seu disco e não me
deu muita esperança. Com Titãs,
será "Papai Me Empresta o Carro", com Paula Toller, "Flagra".
A MTV entrou em contato com
Max Cavalera, mas o garoto não
tem tempo para vir até o Brasil por
enquanto. Seria inusitado tê-lo comigo cantando um bolerão latino.
Já pensou aquela voz chiadona
num "Bandido Corazón"?
Folha - Os colegas de tropicalismo não participarão?
Rita - Eu queria muito os Doces
Bárbaros (Caetano, Gal, Gil e Bethânia), mas todos estarão em excursão na época da gravação.
Folha - Você vai tocar o quê?
Rita - Rita Lee só toca violão até
ver se consegue consertar a harpa e
a "scaletta". Comprei um Theremin, aquele tataravô do sintetizador que eu tocava em "2001" (69).
A gente nem encosta nele. Tem
duas antenas, uma para cada mão.
Tem o mesmo resultado sonoro da
serra com arco -palhaços usam
muito em circo. Vou soprar umas
garrafas, outra coisa de palhaço.
Folha - Você pretende privilegiar
alguma fase da carreira?
Rita - Vai rolar de toda fase um
pouco, chegamos a um consenso
bacana. De Mutantes, "A Balada
do Louco", uma das que mais gosto. Foi a mais votada numa pesquisa que fizemos na Net, e nunca
cantei antes. Adaptei a letra, virou
"A Balada da Louca". De Tutti
Frutti, tem "Agora Só Falta Você", "Eu e Meu Gato", "Coisas
da Vida", "Jardins da Babilônia", "Ovelha Negra". Da dupla
Lee/Carvalho, "Bwana", "Vírus
do Amor", "Cor-de-Rosa Choque", "Desculpe o Auê", "Lança
Perfume", "Dias Melhores Virão", "Santa Rita de Sampa".
Sempre gostei muito de "Gita",
de Raul Seixas e Paulo Coelho. Vamos dramatizar o arranjo, fazer algo flamenco e lírico.
Folha - Haverá inéditas?
Rita - Temos uma porrada de
inéditas, escolhemos entre seis para tirar três ou duas. Há "M Te
Vê", "Alma Gêmea" e um poema de Bertolt Brecht (aquele rapaz
do distanciamento) que musiquei.
Folha - Rita Lee pratica o distanciamento brechtiano?
Rita - Sou adepta do distanciamento de gente chata. Políticos,
igrejas e palmeirenses quando ganham do Corinthians.
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