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MULTIMÍDIA
Evento que reúne diferentes manifestações artísticas presta homenagem a um dos maiores poetas paulistanos
"Galáxias" celebra Haroldo de Campos
IRINEU FRANCO PERPETUO
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Poesia, música, dança, teatro,
vídeo, performance: as linguagens de diversas manifestações
artísticas estarão juntas em "Sonoras Galáxias", evento que homenageia o poeta, crítico e tradutor Haroldo de Campos (1929-2003) nesta semana, no Sesc Vila
Mariana (veja quadro ao lado).
"A idéia que o Cid Campos
[músico e sobrinho do homenageado] e eu tivemos foi realizar
um festival anual em homenagem
a um grande escritor paulistano,
como acontece em outras cidades", diz o musicista Livio Tragtenberg, um dos criadores do
evento. "São Paulo é cruel com os
seus e celebra pouco a cultura
paulistana", afirma Tragtenberg,
lembrando comemorações tradicionais como o Bloomsday, em
homenagem a James Joyce (1882-1941), criado em Dublin, mas
também lembrado em São Paulo,
graças aos esforços de Haroldo de
Campos e Munira Mutran.
Com título aludindo a "Galáxias", um dos mais célebres livros
do homenageado, o evento tem
participantes de áreas distintas,
como o artista plástico Aguilar
(que interpreta poemas editados
em seus livros enquanto o produtor de música eletrônica Loop B
manipula efeitos sobre sua voz), o
músico Arnaldo Antunes (que
também lê poemas, utilizando
playbacks e processador de voz) e
os atores Cacá Carvalho, Bete
Coelho e Giulia Gam.
"A idéia foi juntar música popular, música experimental, teatro e
a poesia ligada a outras mídias,
como vídeo e dança", explica
Tragtenberg. "Celebramos a poética do Haroldo sem a restrição de
ter que apresentar apenas a obra
dele. Ele deve ser o catalisador de
criadores ao redor do mundo, já
que, nas próximas edições, pretendemos ter também convidados de fora do Brasil."
A bailarina Gisela Moreau mostra fragmento de seu espetáculo
"12 Poemas para Dançarmos",
enquanto os músicos Marcos Scarassatti e Marcelo Bonfim fazem
performance com objetos plásticos e sonoros criados a partir de
resíduos e vestígios, como caixas
de madeira, sucata e molas.
A parte musical tem canções de
Cid Campos e apresentação dos
irmãos Lucila e Livio Tragtenberg. "A Lucila vai cantar "Rima
Petrosa", que escrevi a partir do
poema de Haroldo, e foi uma das
últimas coisas que tive a ocasião
de mostrar a ele", diz Livio.
Ele ainda apresenta duas composições. "Claro Haroldo" é uma
obra para clarone solo, pontuada
com intervenções da voz gravada
do poeta. "Conversamos na chave
do humor; ele era muito irônico e
brincalhão." Já "Scratch para Haroldo" (referência ao efeito obtido
por DJs) também utiliza gravações da voz do poeta, dialogando
com saxofone alto e violoncelo.
O evento tem ainda a participação do grupo Poemixbr, que faz
performances utilizando recursos
sonoros e visuais, com projeção
de vídeo; e de Ivan de Campos, filho de Haroldo, que lerá o fragmento inicial de "Galáxias", com
acompanhamento de Alberto
Marsicano ao sitar (instrumento
de cordas da música indiana).
"O público não vai sair de casa
para ver um convescote, ou uma
ação entre amigos", diz Tragtenberg. "O espetáculo tem um roteiro amarrado de luz e som, desenvolvendo uma linha de representação. Não se trata de uma mera
junção de participações".
"Sonoras Galáxias" terá ainda,
como evento complementar, no
sábado, a mesa-redonda "Haroldo de Campos: Poeta Pós-Utópico", com Augusto de Campos (irmão de Haroldo), Boris Schnaiderman, Jacó Guinsburg, João
Alexandre Barbosa e Trajano
Vieira discutindo diferentes aspectos da obra desse que foi um
dos fundadores do movimento da
poesia concreta, nos anos 50.
"Nós nos conhecemos em 1961.
Eu já havia escrito vários artigos
sobre Maiakóvski na imprensa, e
eles também estavam interessados neste poeta", relembra o professor e tradutor Boris Schnaiderman. Por intermédio do crítico e
professor alemão Anatol Rosenfeld (1912-1973), o poeta Décio
Pignatari e os irmãos Campos foram apresentados ao homem que
havia fundado o curso de russo da
USP no ano anterior.
"Ensinei russo a Haroldo por
mais ou menos um ano, e o Augusto fez o curso durante quase
dois anos", diz o tradutor. Com os
irmãos Campos, ele publicou dois
livros de tradução de poetas, diretamente do russo: "Poemas de
Maiakóvski" e "Poesia Russa Moderna". "Havia uma identidade
muito grande entre nós. Pena que
fizemos apenas dois livros -havia trabalho para uma vida inteira", conta Schnaiderman, cuja
participação na mesa-redonda
deve mesclar reminiscências pessoais e questões teóricos.
"Haroldo uma vez disse que,
entre os signos e a vida, ele havia
escolhido os signos. Era um exagero dele, porque, embora sua ligação com os signos fosse grande,
ele era muito vital e emotivo; a vida estava sempre presente."
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