LUIS S. KRAUSZ
especial para a Folha

Uma das mais comoventes obras religiosas do compositor francês François Couperin (1668-1733), "Leçons des Ténèbres", será apresentada hoje à noite no teatro Anne Frank.
É a primeira vez, desde o final da década de 70, que essa peça é levada ao palco em São Paulo.
Ela será interpretada pelas sopranos paulistas Regina Prata e Márcia Regina Soldi, acompanhadas ao cravo por Daniel Calegari.
Compostas sobre um trecho da versão latina das Lamentações de Jeremias (Capítulo 1, Versículos 1 a 14), essas "Lições das Trevas" destinavam-se à liturgia da Semana Santa.
Em seus versos de tom sombrio, o profeta Jeremias lamenta o abandono de Jerusalém e a destruição de seu templo, depois da qual os judeus foram conduzidos ao cativeiro na Babilônia.
Ele atribui esse estado de coisas às transgressões de seu povo.
A derrota frente aos babilônicos e o exílio seriam a maneira escolhida por Deus para punir os pecados do povo de Jerusalém.
Na obra litúrgica de Couperin, a descrição desse estado desolador serve como uma advertência, num momento de arrependimento e de retorno à fé.
Por isso, o compositor acrescentou, ao fim de cada um dos versículos das Lamentações, uma linha extraída do livro de Oséias 14,1: "Jerusalem convertere ad Dominum Deum Tuum" (Jerusalém, retorna ao Senhor teu Deus).
Trata-se de uma obra de execução extremamente difícil, a começar pelo fato de que ambas as vozes precisam ter exatamente o mesmo timbre.
"Há muitos trechos em que as duas vozes se misturam. Uma mesma linha é cantada com melodias sobrepostas, e mesmo o texto às vezes sobrepõe-se, tornando impossível identificar as cantoras", afirma a soprano ligeiro Regina Prata.
A cantora diz que vem namorando essa peça há sete anos, mas demorou para encontrar uma parceira adequada como Márcia Regina Soldi.
Faz parte do programa, também, uma peça para cravo solo, "Les Fastes de la Grande et Anciénne Mxnxstrxndxsx", que será executada por Daniel Calegari.
Composta para ironizar a corporação de ofício dos menestréis de rua e instrumentistas autônomos, chamada "Ménestrandise" -a quem Couperin, compositor da corte e da Igreja, desdenhava- essa é uma suíte em cinco atos.
Começa com um tom majestoso e termina evocando a desordem que os músicos de rua, acompanhados de saltimbancos e animais amestrados, provocavam nas cidades do período barroco.

Espetáculo: Concerto para o Povo de Jerusalém, com obras de François Couperin Quando: Hoje, às 20h30 Onde: Teatro Anne Frank (r. Hungria, 1.000, tel. 011/818-8888) Quanto: de R$ 5 (estudantes) a R$ 10



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