São Paulo, Segunda-feira, 09 de Agosto de 1999
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TELEVISÃO
Mundo acaba após a Letícia Spiller

TELMO MARTINO
Colunista da Folha


Não foi no "The New York Times", mas no jornal que o Ratinho exibiu. Uma ossada de gato, que deveria ser o esqueleto de um chupa-cabras. Ratinho? Sempre ele, a prova evidente de que o sistema "Casa Grande & Senzala" está em vigor na TV. No que a Letícia Spiller pára de dar a pior reputação possível à perfídia, a turma da edícula, ainda enxugando prato, se transfere para o Ratinho.
Com mais brilho na gravata do que na calça e camisa de mangas compridas, ele é recebido pela platéia com palmas e cabeças oxigenadas. Começa o desfile que era e é de horrores, com brindes atirados ao auditório. Nada comparável ao bacalhau do Chacrinha.
Todos são levados a conhecer a seita hindu onde os homens nus enrolam o que parecer mais confortável no próprio bingolim. "Tem um brasileiro que faz a mesma coisa com o dele. Vamos mostrar." Antes, visita-se um casal de anões em sua casa minúscula. Todo conforto e uma máquina de imprimir camisetas, presente do programa. No peito do Ratinho bate um coração? Não é bem assim. Candidatos à caridade têm de se inscrever. Quem render boas imagens é escolhido. Na cartilha do showbiz, esse é o bê-á-bá.
Já que tem coração, Ratinho pode pegar seu cacete e ser truculento. O rapaz garante que uma chupeta comporta o conteúdo de um garrafão de Coca-Cola. Fracassa. No pátio dos milagres, o fracasso é o mais divertido. Alguém lembra da previsão do fim do mundo. Ratinho duvida. O mundo acaba toda noite depois da Letícia Spiller.
O mundo não vai acabar, mas Ratinho prefere fundo musical adequado para essa eventualidade. Seus calouros mantêm o repertório dos artistas convidados. Chegou o carioca de hábitos hindus. "Não, não pode." Surpresa. Ratinho tem medo do que a exibição de um nu frontal masculino possa causar à reputação do programa. Já concurso de transformistas mineiras levemente "faisandées" não compromete.
Ratinho reclama, com "simulação" ("Linha direta" vai morrer de rir da precariedade), do perigo que é morar em SP, incluindo o governador na queixa. É sempre bom um toque de seriedade. Reforma agrária rende também. Mostra uma fazenda em que os sem-terra arrendaram os lotes que ganharam. Mostra outra que prospera. O chefe bem-sucedido, supõe-se, leva a foto do Fidel Castro sempre que vai ao barbeiro.
Antes da Família Lima, americanizada, surge um cantor de dois metros que dá zero para Rita Lee. Bobagem. Todos já tinham dado zero para ele. Ratinho é o exemplo deprimente da acomodação preguiçosa do Sílvio Santos. Falta colégio? Para que mudar?



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