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Recife recebe 24 telas de Eckhout e São Paulo, 206 obras de Rugendas; o conjunto é parte significativa do olhar estrangeiro sobre o continente americano
Quando o Novo Mundo era o Paraíso
FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL
Imagens que ajudaram a construir a idéia de que o Novo Mundo representava o paraíso para o
imaginário europeu chegam em
duas mostras, na próxima quinta,
ao Brasil.
No Recife, são apresentadas as
24 telas realizadas pelo holandês
Albert Eckhout, a partir de sua estada na cidade, entre 1637 e 1644,
período da ocupação holandesa
em Pernambuco. Já São Paulo recebe 206 obras do alemão Johann
Moritz Rugendas, a maioria sobre
sua estada no México (leia texto
abaixo).
As telas de Eckhout chegam
após oito anos de negociação com
o Museu Nacional de Copenhague, segundo o empresário Jens
Olesen, que organiza a exposição.
No ano passado, as telas foram
solicitadas pelo Guggenheim de
Nova York para a mostra "Brazil,
Body and Soul". Elas constam do
catálogo da exposição e são citadas como obras fundamentais para a criação do imaginário sobre o
país, mas acabaram não sendo
emprestadas, por questões de segurança, motivadas pelo 11 de setembro.
Não foram só os norte-americanos que receberam a recusa: "por
duas vezes, em 1896 e 1902, D. Pedro 2º tentou trazê-las para o Brasil, mas ele conseguiu apenas a
permissão de realizar cópias, que
atualmente pertencem ao acervo
do Museu Nacional de História
do Rio de Janeiro", afirma Olesen.
"A demora em organizar a mostra no Brasil ocorreu porque o
museu dinamarquês fazia questão de que as obras fossem exibidas em seu local inspirador, a cidade de Recife, e só agora existe lá
o Instituto Ricardo Brennand,
com condições museológicas
adequadas", diz o dinamarquês
Olesen, que há cinquenta anos viu
as obras pela primeira vez. "Fiquei muito impressionado com a
imagem da índia canibal em uma
das telas", afirma.
Após Recife, a mostra segue para Brasília e São Paulo (na Pinacoteca), reunindo as 24 telas, que representam toda a produção de
pintura de Eckhout -duas telas,
retratos do príncipe João Maurício de Nassau, foram perdidas
após um incêndio no museu dinamarquês, em 1819.
"Nunca os povos americanos
foram vistos e tratados com a dignidade conferida por essas pinturas", afirma Ana Maria de Moraes
Belluzo no livro "O Brasil dos Viajantes", da mostra de mesmo nome, organizada no Masp no ano
de 1994.
Eckhout foi encarregado por
Nassau a retratar os tipos humanos do país e seus produtos típicos, como a mandioca, o coco e
frutas. "Em meio ao caos que
marcou o período da colonização,
Eckhout adotou um modo de ver,
interpretar e organizar a realidade
do Novo Mundo que resultou
num conhecimento inestimável
da fauna, flora e dos tipos humanos brasileiros", afirma Elly de
Vries, no catálogo da mostra.
As telas, de grandes dimensões
-em média 2,67 m por 1,6 m-,
apresentam quatro casais (um de
negros, um de mestiços, e dois de
índios, tapuias e tupinambás),
dois servos, o embaixador do
Congo, a dança dos tapuias e doze
naturezas-mortas. Algumas delas
já participaram de mostras em
São Paulo, mas pela primeira vez
o conjunto completo estará no
Brasil.
A obra de Eckhout é cercada de
dúvidas. "Não se sabe ao certo se
as telas foram pintadas no Brasil, e
há quem diga que foram feitas para um castelo no Recife, dadas as
suas dimensões", afirma Olesen.
A mostra em Pernambuco é
acompanhada de um simpósio,
nos dias 13 e 14, com especialistas
em Eckhout. "Será polêmico, pois
há muitas interpretações divergentes", diz Olesen.
Entre os convidados, estão o curador holandês Martin Boeseman
e a historiadora norte-americana
Rebecca Parker Brienen.
Uma das questões que devem
ser levantadas é a própria história
de como as telas chegaram ao museu dinamarquês. Segundo a versão mais difundida, Nassau doou
as 26 telas para seu primo Friederich 3º, rei da Dinamarca, em
1654, recebendo em troca o título
da Ordem do Elefante Branco.
"Há quem afirme que a doação
ocorreu antes e nada teve com o
título", afirma Olesen.
A exposição é realizada a um
custo de R$ 7,8 milhões, o que representa mais da metade do custo
total da 25ª Bienal de São Paulo.
"Essa mostra é uma operação militar, o valor do seguro das telas é
altíssimo, o transporte tem que
ser realizado com três aviões de
companhias diferentes; além do
mais, em todos os locais por onde
passar terá entrada gratuita, e esperamos mais de 1 milhão de visitantes", afirma o organizador.
RETRATOS DO NOVO MUNDO: O
LEGADO DE ALBERT ECKHOUT. Mostra
com 24 obras do artista holandês,
pintadas no século 17. Onde: Instituto
Ricardo Brennand (r. Engenho São João,
s/nº, Recife, tel. 0/xx/81/3271-2255).
Quando: abertura dia 12, às 19h (para
convidados); até 24/11. Quanto: entrada
franca. Patrocínio: ABN Amro Bank,
McCann-Erickson Brasil e IRB.
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