São Paulo, segunda-feira, 09 de setembro de 2002

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"VELHAS HISTÓRIAS, MEMÓRIAS FUTURAS"

Livro busca significado de Paulinho da Viola na MPB

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL

Prestes a completar 60 anos, Paulinho da Viola se torna tema de estudo no livro "Velhas Histórias, Memórias Futuras", de Eduardo Granja Coutinho, que mergulha na obra do sambista em busca de uma interpretação do significado de sua presença na MPB.
Embora seja fruto de tese de doutoramento de Coutinho na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o livro não se apega a tecnicismos ou elaborações restritivas. É técnico e fundamentado, mas de fácil acesso a qualquer admirador de Paulinho, de samba, de MPB, de música ou... de política.
A mira do autor é o entendimento do lugar que Paulinho da Viola ocuparia em meio a chicos, caetanos e miltons.
Não à toa, um dos ápices do livro é sua releitura sobre o episódio do show de réveillon carioca de 1996, em que o sambista recebeu cachê de R$ 30 mil, contra R$ 100 mil pagos a cada um seus pares emepebistas Caetano, Gil, Chico, Gal e Milton.
O foco da pesquisa recai na significação política do apego de Paulinho à tradição (mas não ao tradicionalismo conservador, como faz questão de ressaltar sempre o autor).
Para chegar às conclusões que cobiça, o livro tem de, antes de tudo, fazer uma extensa revisão dos modos de participação política da canção na década de 60, com ênfase na canção de protesto e na reação a ela elaborada depois pela tropicália.
Quanto à fase do protesto, marcadamente nacionalista, avalia: "Populistas e passadistas são incapazes de pensar a história como um processo em que o passado é reconstruído pelo presente, interpelando, dessa maneira, as gerações futuras".
Já a tropicália corresponderia ao fim da atitude participante da juventude na MPB, tornando-se "marco da derrota da esquerda populista e da vitória de um projeto globalizante que hoje revela sua face neoliberal".
Ali, o consumo se tornaria então referência para medir o que fosse "popular", num projeto de culto ao novo e também à necessidade de ruptura, mas ainda de "aceitação tácita das regras do mercado".
Dessa análise, Coutinho extrai, então, a tese central do livro, de que Paulinho da Viola surge para negar com delicadeza as duas vertentes em prol de um outro projeto, nem passadista, nem populista, nem mercadológico.
Sem nunca aderir à bossa nova, o artista desenvolve o aspecto harmônico do samba, reaproximando-o do choro.
Para o autor, Paulinho da Viola faz com samba e choro o que a bossa fizera com samba e jazz, elaborando uma renovação que não desprega em nenhum momento o olho da tradição.
Mas a diferença de origem e classe seria um muro entre a bossa e o samba moderno de Paulinho da Viola.
Negro e sambista, ele nunca tiraria de mente o status do samba como algo da cultura marginal e "subalterna", fazendo-se representante, com sua música, de uma comunidade permanentemente aviltada.
O que o livro celebra, enfim, é também a (acidentada) permanência da estratégia de Paulinho da Viola na cultura brasileira, para lá do sumiço dos militantes do protesto, para cá da voracidade dos militantes do consumo.


Velhas Histórias, Memórias Futuras
   
Autor: Eduardo Granja Coutinho
Editora: Eduerj
Quanto: R$ 22,50 (184 págs.)



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