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EROTISMO
Mandarim publica textos do ensaísta mexicano sobre o autor de "Filosofia na Alcova"
Sade não era sádico, disse Octavio Paz
CYNARA MENEZES
da Reportagem Local
Sabe-se lá quem
era maior: o Octavio Paz poeta ou o
Octavio Paz ensaísta? Pouco importa. O que interessa dizer é que, mesmo quem
não gosta de ler ensaios, se sentirá atraído pelas reflexões do autor mexicano, morto em abril do
ano passado.
Seu "Labirinto da Solidão", de
1950, aqui publicado pela Paz e
Terra -ainda disponível em algumas livrarias em sua terceira
edição, de 84-, é uma preciosidade que, segundo muitos críticos, incluiu o México no mapa
do pensamento ocidental.
Publicado pelo escritor quando vivia em Paris, revelando ao
mundo aquele que ganharia em
90 o Nobel de Literatura, o "Labirinto" seduz o leitor desde a
primeira linha, sobretudo quando se dedica a falar da morte, essa desconhecida, que para os
mexicanos é motivo de festa.
Agora, sai no Brasil "Um Mais
Além Erótico: Sade", reunião de
três escritos de Paz sobre o marquês cuja ascensão póstuma se
deve à sua descoberta pelo poeta
Guillaume Apollinaire e pelos
(hoje subvalorizados) surrealistas na década de 30, que fizeram
dele, segundo o próprio mexicano, "um símbolo de rebeldia".
O primeiro texto é justamente
um poema, "O Prisioneiro", escrito um ano depois de Octavio
Paz descobrir Sade (em 46) e se
impressionar com a repentina
adoração do ex-maldito. "Tu,
que estavas contra todos,/És
agora um homem, um chefe,
uma bandeira", diz o poema.
Mais tarde, em 60, no ensaio
que dá nome ao livro, refletia sobre as diferenças entre erotismoe sexualidade. Segundo Paz,
o primeiro é mais complexo. "A
sexualidade é simples: o instinto
põe em movimento o animal",
enquanto "o erotismo é desejo
sexual e alguma coisa mais".
No terceiro ensaio, o "definitivo", escrito em 86 -""Cárceres
da Razão"-, voltava a mostrar
sua surpresa com a aceitação do
"teórico" do sadismo pela contemporaneidade. "A moda de
Sade me deixa perplexo", escreveu, para admitir em seguida
que isso era "um triunfo da inteligência sobre os preconceitos e
os medos ancestrais."
O mais interessante do livro,
porém, é observar a possibilidade de escrever sobre um escritor
vulgarizado sem ser vulgar para
isso. Octavio Paz não se diverte
nem graceja sobre a figura do
marquês ou suas engenhocas de
dor/prazer que hoje fazem a alegria dos frequentadores de sex
shops. Antes, como adverte o
ensaísta no prólogo, tenta entendê-lo. É sério.
A melhor polêmica desses ensaios acontece com Jean Paulhan, autor do prólogo de "Justine ou As Desgraças da Virtude",
uma das obras de Sade, que afirma ser o escritor um masoquista. Paz rejeita tal afirmação: "O
prazer do sádico acabaria se percebesse que sua vítima também
é seu cúmplice".
Vai além, ao dizer que o marquês tampouco era sádico. Embora tenha sido "um inimigo do
amor, (...) para ele uma quimera
nefasta", Sade "foi generoso até
mesmo com seus inimigos e perseguidores".
Com 27 anos passados "em diferentes prisões e num hospício,
manuscritos destruídos, livros
apreendidos", Sade chega a ser
comparado a santo Agostinho
por Octavio Paz em sua "negação universal", com a diferença
de que para um (o santo) o bem
é o que importa, e para outro era
o mal a única realidade existente. "O filósofo do sadismo", afirma Octavio Paz, "não foi aquele
que vitima, mas uma vítima, o
teórico da crueldade foi um homem bondoso".
Livro: Um Mais Além Erótico: Sade
Autor: Octavio Paz
Tradutor: Wladir Dupont
Editora: Mandarim
Quanto: R$ 15 (119 págs.)
Avaliação:
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