São Paulo, terça-feira, 09 de outubro de 2001

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LITERATURA POP

Livro "A Noite dos Cangaceiros Mortos-Vivos" trata desde corrupção até tráfico de armas

"Pulp fiction" nacional apela para quadrinhos

DIEGO ASSIS
DA REDAÇÃO

No mesmo dia em que o símbolo do capitalismo mundial caía diante do olhar atônito de milhões de telespectadores, em 11 de setembro, saía das gráficas o primeiro manual da "revolução cangaceirista" no Brasil. Seu principal objetivo: destruir por completo a capital federal do país.
"Entendo aquela cidade como um símbolo do stalinismo opressor, planejada meticulosamente para reduzir qualquer forma de manifestação popular à nada", afirma Edson Aran, 38, redator-chefe da revista "VIP", ex-frequentador do Madame Satã e autor de "A Noite dos Cangaceiros Mortos-Vivos".
"Brasília nasceu sebastianista. Foi feita para abrigar um iluminado qualquer. Lá, no meio do cerrado, cercado por prédios futuristas cafonas, o Grande Líder botaria ordem no caos", completa o personagem Ermenegildo Pinto, 38, ex-bancário, líder do Comando Armado Revolucionário dos Cangaceiros Mortos-Vivos e protagonista do livro.

Dom Sebastião
As opiniões de Aran e de seu personagem se confundem assim mesmo. Lançada pela editora Nova Alexandria, a obra é uma visão politicamente incorreta da tese do jornalista, para quem, numa herança direta dos portugueses, o brasileiro estaria ainda à espera da volta do rei dom Sebastião para que pudesse ver alguma coisa mudar.
No livro, Edson Aran vira de ponta-cabeça esse mote quando dá ao protagonista dois desastrosos aliados -um sósia de Raul Seixas e um índio mato-grossense- na tentativa de instituir uma "República Cangaceirista do Brasil" e provar ao país inteiro que "só um autêntico cangaceiro pode se dar bem nessa tal de nova economia".
Usando e, por vezes, abusando dos clichês-pastelão e do binômio sexo-drogas, Aran constrói uma narrativa ao mesmo tempo realista (temas como tráfico internacional de armas e corrupção política foram pinçados diretamente das páginas de jornais) e surrealista -ao descrever, por exemplo, uma convenção de milhares de sósias de Raul Seixas, em Parati, ou um quebra-pau protagonizado por artistas plásticos "mudernos", no bairro paulistano da Vila Madalena.

Filme barato
"Queria que o livro parecesse um filme de ação barato. Pensava em atrair um público adolescente, que praticamente não lê", defende Aran, que escreveu também a obra "Aqui Jaz - O Livro dos Epitáfios" (Ática). Para tanto, buscou agora a ajuda do ilustrador Rogério Nunes com a intenção de dar um visual "mais HQ" à aventura.
Iconoclasta até o osso, não poupa brancos, negros, vermelhos ou amarelos. Em uma passagem de nem duas páginas, contam-se mais de 30 palavrões.
"Definitivamente não é algo para um leitor de James Joyce. Não quero isso. Tem gente demais fazendo literatura séria neste país", o escritor alfineta.
Questionado a respeito da mórbida semelhança entre os acontecimentos de sua história -que tem um avião sequestrado ameaçando explodir sobre a praça dos Três Poderes- e os atentados às torres gêmeas de Nova York, Aran diz: "Essa era uma idéia antiga minha. Como se comportaria alguém que tivesse a vontade e os meios de fazer uma maluquice dessas?".


A NOITE DOS CANGACEIROS MORTOS-VIVOS. De: Edson Aran. Editora: Nova Alexandria. Quanto: R$ 23 (196 págs.).


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