São Paulo, quarta-feira, 09 de outubro de 2002

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Cantor e compositor lança o terceiro CD, sai da gravadora Virgin e patrocina projeto de cantores de rua em Barcelona

Manu Chao em busca de liberdade

MARTA BARBOSA
FREE-LANCE PARA A FOLHA, EM BARCELONA

Na semana de lançamento do seu terceiro CD, "Radio Bemba Sound System", o francês Manu Chao reservou duas noites para tocar. Não em show promocional ou coisa do gênero, mas como DJ, sua atual diversão favorita.
A aventura nos pick-ups aconteceu no antigo e esfumaçado Puerto Hurraca, bar no distante bairro de Poble Nou, numa Barcelona que turista nenhum se atreve a conhecer.
Chao tocou por quase quatro horas: reggae, ska e breakbeat, com direito a "Garota Nacional", do Skank. Nas caixas não se ouviu um sampler sequer de alguma de suas canções. Nada raro para um cantor que prefere ser identificado como um músico de rua que deu certo, rejeita rótulo de estrela pop e se prepara para dar o ponto final no contrato com a Virgin, segundo ele, "em busca de mais liberdade para o seu trabalho".
"Radio Bemba Sound System" é, então, seu último disco sob o comando da gravadora, que também deve ganhar versão em DVD até o final deste ano. Chao é artista da Virgin desde quando era o líder da divertidíssima Mano Negra e percorria portos da América do Sul num grande navio com outros tantos artistas franceses.
Aos 41 anos, ele agora quer sossego. Não está rompendo nada. O contrato previa mesmo três discos de sua carreira solo. "Clandestino" (1998) e "Próxima Estação: Esperança" (2001) foram os primeiros. O fim da trilogia não podia ser menos festivo. "Radio Bemba Sound System", nome de sua banda, foi gravado ao vivo no ano passado em Paris. São 29 faixas e 64 minutos de alvoroço musical. O produtor é o mesmo dos dois primeiros trabalhos, Renaud Letang. E não faltam as já tradicionais interferências radiofônicas e a voz do líder zapatista subcomandante Marcos.
A maioria é música já bem conhecida, como "Clandestino" e "Minha Galera". Outras ele toma emprestado do Mano Negra ("Casa Babylon", "King Kong Five"). Mas nada está igual. "Bienvenida a Tijuana" ganha duas versões, as duas modificadas da original. "Uma para escutar, outra para dançar", diz.
Se existe uma música que resume o novo disco, é "Radio Bemba", desta vez com uma batida incansável entre o punk rock e o frenético ska. Todas as canções estão fundidas e confundidas por samplers, num tom intenso de balbúrdia da primeira à última faixa. "É a prova de como aperfeiçoamos ao vivo esta fusão de músicas, com o uso de samplers."
A idéia do terceiro disco ser gravado ao vivo já estava nos planos de Chao. O objetivo, explica ele, era deixar registrada "a qualidade incrível da banda que esteve junta durante três anos". Foram 120 shows em 39 países, do Brasil à Letônia, da Croácia ao Japão.
Francês filho de espanhóis, Oscar Tramon (seu nome verdadeiro) mantém todas as referências latinas em seu novo trabalho, com toques de rumba em meio a batidas eletrônicas. E até faz lembrar do início de sua carreira, quando assinava trilha sonora para apresentações de circo e tocava para uma trupe que fazia acrobacias.

Músicos de rua
Encerrado o projeto de rodar o mundo fazendo show e agora sem a Virgin, o cantor está envolvido em um trabalho em defesa dos músicos de rua de Barcelona. Deu entrevista coletiva, coisa rara em sua carreira, para reclamar da ação da polícia espanhola contra os artistas "callejeros" e bancou a produção de um disco desses ainda anônimos.
"Hoje um músico de rua recebe tratamento pior da polícia do que muitos ladrões. É mais perigoso sacar um violão que uma arma", afirma ele. "La Colifata" é o primeiro volume de uma série em benefício à música de rua. Os 21 autores podem ser escutados nas esquinas de Barcelona e, para a maioria, esse é o primeiro trabalho de estúdio.
A influência de Manu Chao é mais que clara. Além da sua voz em algumas faixas, o disco obedece à mesma cartilha do cantor, usando, por exemplo, os efeitos radiofônicos, desta vez trazidos de um programa de rádio realizado por pacientes de um hospital psiquiátrico. Aliás, o nome do álbum é o mesmo do programa.
O difícil será conseguir um desses discos, 3.000 cópias ao todo, já que eles não serão vendidos em lojas. A recomendação é consegui-los por meio de "seu músico de rua favorito", tarefa quase impossível para quem não mora em Barcelona. Mas, na falta, tem "Radio Bemba Sound System", que sai este mês no Brasil.


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