São Paulo, quarta-feira, 09 de outubro de 2002

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CRÍTICA

Uma chance rara de ver Escorel

ESTHER HAMBURGER
CRÍTICA DA FOLHA

Hoje à noite, o canal Brasil oferece uma rara oportunidade de assistir a um filme de Eduardo Escorel, que, como muitas produções nacionais, não existe em vídeo e dificilmente ganha espaço na telinha.
"Ato de Violência" (80), com Nuno Leal Maia, é baseado na história real de Chico Picadinho, esquartejador de mulheres. Precedido do programa "De Conversa em Conversa", sobre a situação carcerária brasileira, o filme do diretor, que vai lançar documentário sobre o levante comunista de 35, marca dez anos do massacre do Carandiru.
A ocasião merece ser lembrada. A aberração deslocou a violência para o centro dos acontecimentos. Com ela, o Carandiru que no início do século aparece como presídio modelo, demonstração da modernidade da metrópole emergente, tem seu significado invertido. O Carandiru torna-se locus privilegiado de representação da nossa selvageria.
Da instalação conceitual do artista plástico Nuno Ramos ao livro quase etnográfico de Drauzio Varella, passando pelos aguardados filmes de Paulo Sacramento e Hector Babenco, o Carandiru hiper-representado ironicamente finalmente sucumbiu.
Há cerca de 20 anos na mira de técnicos que, como Julita Lemgruber (que participa do "De Conversa em Conversa"), por incrível que pareça sabem o que fazer para controlar a violência, o presídio que se tornou cenário privilegiado de revoltas e escândalos foi desativado.
Exposto à visitação pública, o complexo recentemente atraiu a curiosidade de milhares de cidadãos interessados em testemunhar articulações que usualmente permanecem nas sombras.
O entrelaçamento de tráfico, crime, corrupção, desarticulação, ineficiência, poder paralelo e violência fez do Carandiru metáfora do Brasil. Há dez anos do massacre, em pleno processo eleitoral, vale rememorar e cobrar dos candidatos ousadia em projetos, como o das penas alternativas, discutido no programa, que subvertam a espiral da violência.


DE CONVERSA EM CONVERSA e ATO DE VIOLÊNCIA - Canal Brasil, às 23h e 0h, respectivamente.


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