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SARAMAGO
Escritor já havia comparado o Nobel com bingo
RUI NOGUEIRA
da Sucursal de Brasília
Para "pôr a claro o assunto", Saramago anotou em 14 de outubro
de 95, no seu diário: "Em primeiro
lugar, o dinheiro é dos suecos e eles
dão-no a quem entendem; em segundo lugar, há que acabar com
esta história de andar como de
mão estendida a implorar a esmolinha de um Nobel; em terceiro lugar, é absurdo fazer depender o
prestígio da literatura portuguesa
de se ter ou não se ter um Nobel;
em quarto lugar, se o cheque fosse,
por exemplo, de US$ 10 mil, o planeta de escritores pouco se importaria com ele; em quinto lugar, e
concluindo, deixemo-nos de hipocrisias e tenhamos a franqueza de
reconhecer que, nessa comédia, o
que conta é o dinheiro".
A comédia da vida regida pelo dinheiro e que, todo outubro, como
dizia o próprio Saramago, promovia uma "espécie de bingo" em torno de quem seria o Nobel de Literatura, livrou o escritor da obrigação de ter de explicar o destino de
sua eterna candidatura ao prêmio.
Em "Cadernos de Lanzarote", o
tema Nobel é recorrente. Um dos
momentos mais significativos foi
registrado em abril de 93 e envolve
uma entrevista do escritor à Folha.
O escritor Antônio Houaiss
apostava no poeta brasileiro João
Cabral de Melo Neto e em Saramago para vencer o Nobel. Solicitado
a comentar, ele tomou emprestada
uma declaração do inglês Graham
Greene e anotou no diário:
"Esgotada a minha capacidade
de abnegação e modéstia e para
não aparecer aos olhos dos leitores
da Folha como um sujeitinho hipócrita, acrescentei, desta maneira
me sangrando em saúde: "Em todo
o caso, parecer-me-ia justo que o
primeiro Nobel para a língua portuguesa fosse dado a um português, porque, na verdade, vai para
900 anos que estamos à espera dele, enquanto vocês (brasileiros)
nem sequer dois séculos de esperanças frustadas levam...'."
A esperança tinha fundamento,
tamanha a popularidade do escritor e seus prêmios. Pelo menos um
brasileiro pressentiu que ele estava
a caminho. Em 93, Jorge Amado ligou para Saramago parabenizando-o por ter ganho um prêmio no
Reino Unido. E avisou que "um
destes dias chega aí um telefonema
de Estocolmo". Chegou o cheque, é
de cerca de US$ 1 milhão.
Para o próximo cheque, dois
candidatos: João Cabral e o português Lobo Antunes. A esperança
não mata.
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