São Paulo, Terça-feira, 09 de Novembro de 1999
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LITERATURA
Ganhou Pulitzer com "As Horas"
Cunningham faz palestra em SP

SHEILA GRECCO
da Redação


Michael Cunningham, 47, um dos mais importantes nomes da atual literatura americana, está no Brasil pela primeira vez. Após uma passagem pela Feira do Livro de Porto Alegre, ele faz hoje palestra no Sesc Vila Mariana, em SP. Depois dos polêmicos "Uma Casa no Fim do Mundo" (94) e "Laços de Sangue" (97), o autor conquistou reconhecimento com "As Horas".
Ele ganhou neste ano os dois mais importantes prêmios literários norte-americanos, o Pulitzer Prize de ficção e o PEN/Faulkner e foi sucesso de vendas. "As Horas" é uma reescritura do clássico de Virginia Woolf "Mrs. Dalloway".
O romance narra um dia na vida de três mulheres de diferentes gerações. Cunningham, que já disse escrever improvisando como a guitarra de Jimmy Hendrix, investiu em pesquisa e estilo.
Dissecou a obra de Woolf e fez questão de visitar o pequeno rio Ouse, onde ela teria se suicidado aos 59 anos, no sudeste da Inglaterra. "Quando pensava na cena do suicídio, imaginava um rio enorme como Mississipi ou o rio Amazonas, alguma coisa impulsiva", explicou o autor em entrevista à Folha, de Manhattan, antes de embarcar para o Brasil.
A surpresa com o insignificante riacho lhe deu a marca precisa do desespero de Woolf. Essa experiência quase teatral mudou os rumos de seus escritos. O interesse pela literatura de Woolf surgiu aos 15 anos, quando era estudante na Califórnia do Sul.
Uma amiga, mais velha e intelectual, horrorizada de saber que ele não conhecia a obra da escritora inglesa, ofereceu-lhe um exemplar de "Mrs. Dalloway". "A beleza e a musicalidade me atingiram de maneira que eu não podia entender ainda àquela época. Todo leitor tem um primeiro grande livro. Como todos têm a experiência de um primeiro grande beijo".
Woolf dizia que tudo o que se precisava saber sobre a essência humana cabia em duas pessoas tomando café juntas. O autor foi motivado por este pensamento e admite que a experiência como barman o ajudou a extrair o sublime dos fatos mais ordinários.
"Atos comezinhos como comprar flores, trocar beijos, olhares, fazer um bolo não estão no livro à toa". O autor escreveu sob a máxima influência de Woolf, mas sem imitá-la, o que seria um erro.
"Jamais escrevi um livro imaginando uma leitura obrigatória prévia. Mas se as pessoas se interessarem por descobrir as referências ou redescobrir o trabalho de Woolf, está feito o tributo".
Cunningham diz não ligar para prêmios e ter se surpreendido com o reconhecimento da crítica. Mesmo assim "As Horas" pode ser lido como "Mrs. Dalloway" dos anos 90. O livro de Cunningham questiona as estruturas familiares contemporâneas, a Aids e as ilusões dos relacionamentos.
Casado há 12 anos com o psiquiatra Ken Corbett, o autor rejeita os rótulos de "escritor dos homossexuais e dos outsiders". "Ser gay e escrever para gays é panfletário e significaria a morte da arte". Em busca de novas expressões da arte, ele finaliza um roteiro para a Universal Studio.


Palestra: Michael Cunningham Quando: hoje, às 20h Onde: Sesc Vila Mariana (r. Pelotas, 141, Vila Mariana; tel. 0/xx/11/5080-3000) Quanto: entrada franca Livro: As Horas Autor: Michael Cunningham Tradutora: Beth Vieira Editora: Companhia das Letras Quanto: R$ 21 (182 págs.)



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