São Paulo, segunda, 9 de novembro de 1998

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POLÍTICA CULTURAL
Proposta de Weffort de taxar filmes foi descartada por produtores, distribuidores e exibidores no Rio
Mercado vê erro em taxa do "lixo cultural'


PATRICIA DECIA
enviada especial ao Rio

Um projeto equivocado e retrógrado. Assim produtores e distribuidores avaliaram a proposta do ministro da Cultura, Francisco Weffort, de taxação do "lixo cultural" cinematográfico, descartada em reunião realizada na última sexta-feira, no Rio.
O aumento da tributação sobre filmes importados, com o objetivo de conseguir mais espaço para o cinema nacional, foi formulado a partir de um "erro técnico", segundo o produtor Luiz Carlos Barreto.
"Houve uma controvérsia em torno dos números e teremos de reexaminá-los antes de qualquer medida", disse o ministro.
Essa é a segunda vez em seu mandato que Weffort é obrigado a voltar atrás em propostas protecionistas para a produção cultural brasileira, baseadas em informações incompletas.
Caso semelhante aconteceu no final de 1996, quando o ministro incentivou a taxação de fonogramas estrangeiros, com o objetivo de proteger a música nacional.
Na época, verificou-se que a música brasileira popular é majoritária em vendas e execução, e a "Lei da Música" acabou por ser descartada pelo governo.
Desta vez, o ministério tinha em mãos um relatório produzido pelos exibidores referente ao ano de 1997. Segundo o documento, dos 356 filmes exibidos no país, 103 tiveram público menor que 10 mil espectadores.
Pela análise do MinC, isso mostrava que grande parte desses filmes são "lixo cultural", ou seja, chegaram ao país por causa de uma prática habitual, mas jamais admitida pelo mercado. Eles viriam numa espécie de pacote, acompanhando a compra de títulos de sucesso, como "Titanic".
Para que esses filmes entrem no país, têm de ser registrados e pagar uma taxa de R$ 1.025.
O projeto de Weffort propunha um aumento desse valor, que seria discutido com representantes da área, obrigando os importadores a refletir melhor na hora de realizar uma compra.
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"A Enguia"
O primeiro argumento contra a proposta é que, sob o mesmo guarda-chuva do "lixo cultural", estão filmes de arte, independentes, relançamentos e títulos exibidos em mostras cinematográficas. A taxação atingiria indiscriminadamente essa variedade.
Weffort havia sugerido que os filmes de arte poderiam ser facilmente identificados -e protegidos- pelo próprio ministério, recebendo a isenção da taxa.
Uma prova de que a diferenciação não é simples ocorreu na própria reunião de sexta.
Durante a discussão em cima de uma lista de filmes, representantes do ministério pensaram que "A Enguia", do diretor japonês Shohei Imamura, premiado no festival de Cannes em 1997, fosse um filme pornográfico.
Para Rodrigo Saturnino Braga, gerente-geral da distribuidora Columbia, a discussão remete à época em que a Embrafilme era acusada de financiar pornochanchada. "Não se pode pegar uma lista de títulos e dizer que é lixo cultural sem nem sequer assistir ao filme. Eu repudio a figura do lixo cultural."
Braga diverge ainda da interpretação dos números.
Segundo ele, cerca de 100 dos 385 filmes não foram importados em 1997 -teriam sido lançados no ano anterior, 1996, e continuado em exibição ou relançados.
De acordo com a avaliação do distribuidor, que provocou a revisão dos números pelo ministro, apenas 54 filmes importados e lançados em 1997 ficaram abaixo dos 10 mil espectadores.
A maioria deles teria sido exibida em tradicionais salas de filmes de arte.
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Vídeo e TV

Outro argumento é que a medida vê o mercado audiovisual como há 20 anos, deixando de lado o vídeo, a TV paga e a TV aberta. A taxa deveria ser paga para a exibição da obra em cada um desses meios, o que não acontece atualmente.
Barreto também afirma que uma solução para aumentar recursos é combater a evasão do pagamento.
Moacir Oliveira, secretário do Audiovisual do MinC, diz que a sonegação do registro em vídeo já foi detectada, mas não serão tomadas medidas por enquanto.
"Estamos tentando encontrar um solução que abranja todos os setores", afirma o secretário.
Também participaram da reunião Anibal Massaíni, Leonardo Monteiro de Barros e Mariza Leão, representando os produtores, Iôna Macedo, representando os exibidores, Adalberto Macedo, Adhemar de Oliveira e Roberto Darze, representando os distribuidores.
Os membros da comissão deverão reunir-se agora com o presidente Fernando Henrique Cardoso. Levarão a ele o pedido de criação de um fundo para financiar a comercialização dos filmes. O governo teria de entrar com R$ 10 milhões, provenientes da dotação orçamentária, para iniciar o fundo.



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