São Paulo, quinta-feira, 09 de dezembro de 2010

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comida

Carnes da hora

Altos preços inibem consumo de filé e picanha , mas estimulam cortes mais saborosos e baratos

Fotos Letícia Moreira/Folhapress
Maminha marmorizada do North Vila Nova, que custa R$ 45, o bife de tira (da picanha), R$ 65

JOSIMAR MELO
CRÍTICO DA FOLHA

Eu sou o chato que há anos prega no deserto contra carnes caras e sem graça como filé-mignon e picanha, molezinhas, é verdade, mas com pouca fibra (em todos os sentidos), suculência e sabor.
Ironicamente, é por elas ganharem agora mais "valor" (na verdade, mais preço), com o encarecimento da carne bovina, que o consumidor repara em cortes menos "valorizados" -e muito melhores como gastronomia.
Com o preço do filé-mignon pulando 80% em 20 dias, começam certos efeitos salutares para o paladar.
Primeiro, a revalorização dos saborosos cortes da costela e da alcatra, entre outros -que, mesmo mais caros, custam menos que os famosos. Além dos cortes que se consideravam "de segunda", mais duros, do dianteiro, excelentes para panela e forno.
Outra consequência poderá ser a redescoberta dos miúdos e semelhantes (língua, fígado, rins), meio saboroso, nutritivo e barato de manter a paixão histórica da humanidade pela carne.
Para isso, porém, seria preciso que a causa perversa -a alta nos preços- não se reverta. O que é o mais provável, para o especialista Sylvio Lazzarini, do Varanda Grill.
"O consumo está aquecido, pela entrada de mercados como a China e o aumento do poder aquisitivo no Brasil. Além disso, a Argentina parou de exportar, e nosso rebanho está estabilizado."
Assim, a procura deve continuar maior do que a oferta, e os preços não devem baixar. Hora do consumidor migrar para cortes mais baratos e, na verdade, melhores. "Na minha casa não se come picanha há uns 15 anos; prefiro os cortes lombares e o vazio [fraldinha]", diz ele.
Em seu restaurante, a picanha também está em baixa. Os próprios maîtres advertem os clientes de que sem exportações argentinas, e com a produção brasileira estagnada, está difícil ter boa picanha. E, ainda assim, ela custa R$ 76 (320 g).
Em contrapartida, o "rib-eye" australiano ou o uruguaio, de gado angus, custa menos -R$ 71 (mais de 380 g). Sem falar na suculenta fraldinha, que sai a R$ 56.
O novo North Vila Nova serve uma peça de maminha incrivelmente marmorizada. Custa R$ 45. O filé-mignon, R$ 55; e o bife de tira (da picanha), R$ 65. Alguma dúvida sobre qual escolher?

CAEM MITOS
No Baby Beef Rubaiyat, a queda na oferta de carnes levou à criação de menus específicos com cortes de cada país -Brasil, Argentina, Uruguai, Austrália.
O proprietário Belarmino Iglesias Filho diz que não aplicou aumento diferenciado para a picanha, preferência do seu público, e o consumo do corte não foi afetado.
"Mas, quando se mexe no bolso, é que se derrubam alguns mitos", diz, "e pela primeira vez pode-se romper o mito de que há carnes de segunda, quando se fala dos cortes de dianteiro, que na verdade são excelentes".
No Templo da Carne de Marcos Bassi, a portentosa costela de boi, que leva ao delírio cinco pessoas, sai a R$ 33,60 por pessoa. O miolo de alcatra tem preço semelhante, e a fraldinha, menor ainda. Não está na hora de conhecer esses cortes?
O aumento também leva restaurateurs a fugir de carnes bovinas, usando a imaginação para manter preços palatáveis. Carlos Ribeiro, do Na Cozinha, embarcou nessa: para não subir o preço do almoço, serve tortas de frango, empadão goiano, massas frescas com legumes. Boi, só à la carte, e cada vez menos.


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