São Paulo, sábado, 10 de janeiro de 2004

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Cinema brasileiro perde o radical Rogério Sganzerla, aos 57 anos

Folha Imagem
O diretor Rogério Sganzerla (em foto de 1978), autor de "O Bandido da Luz Vermelha"; corpo do cineasta será cremado hoje, em São Paulo


Cineasta deixa roteiro inédito, em que retoma seu maior clássico, "O Bandido da Luz Vermelha" (1968)

DA REPORTAGEM LOCAL

Será cremado hoje, no Cemitério da Vila Alpina (SP), o corpo do cineasta Rogério Sganzerla, morto ontem, aos 57 anos, de câncer. Na próxima sexta, a mulher do diretor, a atriz Helena Ignez, enterrará as cinzas em Joaçaba (SC), cidade-natal do cineasta.
Internado no Hospital do Câncer, Sganzerla trabalhou até a semana passada no roteiro de "Luz nas Trevas -Revolta de Luz Vermelha", filme em que pretendia rever seu longa de estréia, "O Bandido da Luz Vermelha" (1968), um clássico do cinema brasileiro. Ignez e a filha Djin Sganzerla pretendem produzir e dirigir o filme.
Antes de filmar "O Bandido...", Sganzerla trabalhava como crítico de cinema e realizou apenas um curta, "Documentário" (1967), pelo qual foi premiado num concurso de cinema amador com uma viagem à Europa.
No retorno da viagem, o diretor leu a notícia do crime que o inspirou a filmar "O Bandido...". O personagem do episódio real, João Acácio da Costa, morreu em 1998. Ao primeiro filme, seguiu-se "A Mulher de Todos" (1969), estrelado por Helena Ignez. Em 1970, o casal e o diretor Julio Bressane abriram a produtora Belair.
A Belair tornou-se sinônimo de uma forma de fazer filmes contrária a todas as convenções (de filmagem e montagem) e se firmou como um pólo de oposição intelectual aos expoentes do movimento do cinema novo.
Em 1968, Sganzerla afirmou: "Nossos filmes [os brasileiros] são diferentes de todos os outros, mesmo quando copiamos os europeus". A frase era um prenúncio da tensão que marcaria toda a sua carreira: o desafio de uma expressão nacional em sua arte, em paralelo com a revolta em relação a um país que, em sua opinião, maltrata os verdadeiros artistas.
A dificuldade para obter financiamento para a produção de seus filmes seguintes provocou longos atrasos em seus projetos.
O primeiro título da trilogia sobre a passagem do cineasta norte-americano Orson Welles (1915-1985) pelo Brasil, "Nem Tudo É Verdade", foi preparado ao longo de seis anos (1980 e 1986). Em 1988, Sganzerla disse: "Eu tenho mais tentado do que conseguido trabalhar". O último filme que concluiu "O Signo do Caos" (2003), foi finalizado sete anos após o início das filmagens.
Apresentado no Festival de Brasília em 2003, "O Signo do Caos" deu a Sganzerla o prêmio de melhor diretor. Já doente, o cineasta não compareceu , mas enviou um texto em que repisava a indignação com o sistema de financiamento de filmes no Brasil -atualmente concentrada na aprovação, pelo governo, de projetos que, com benefício de leis de renúncia fiscal, dependem de empresários para obter patrocínio.
"Nosso país é o mesmo, com todos os seus censores, curadores, feitores, malfeitores e manipuladores de opinião pública em geral, que estrangulam a atividade inventiva do cinema."
Autor de frases como "Bem-aventurados os caolhos, porque só vêem a metade da realidade", Sganzerla andava sereno. "Ele apenas parou de respirar e sorriu", diz a filha Djin Sganzerla.


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