São Paulo, sábado, 10 de fevereiro de 2007

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Sessão de "O Ano" em Berlim seduz o júri e a imprensa

Filme do brasileiro Cao Hamburger recebe aplausos em sua primeira exibição, ontem, no festival de cinema alemão

Outro concorrente ao Urso de Ouro, "O Segredo de Berlim", com George Clooney e Cate Blanchett, divide platéia especializada


SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL A BERLIM

O filme brasileiro "O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias", de Cao Hamburger, seduziu ontem o Festival de Berlim. Terminou sob aplausos a primeira exibição do longa no festival, às 9h (6h, no horário de Brasília), para a imprensa e para o júri da competição.
O segundo filme apresentado ontem na disputa pelo Urso de Ouro, "O Segredo de Berlim", de Steven Soderbergh, teve acolhida bem diferente -os poucos aplausos ouvidos na sessão de imprensa foram rebatidos por vaias. "O Segredo de Berlim" é estrelado por George Clooney, um correspondente de guerra, Tobey Maguire, um oficial americano, e Cate Blanchett, a mulher disputada por ambos, na devastada Berlim de 1945. É filmado em preto-e-branco, dirigido em estilo noir e tem cenas abertamente decalcadas de "Casablanca", como o final numa pista chuvosa de aeroporto.
Hamburger comprovou a aprovação de seu filme quando chegou à sala de entrevistas coletivas e foi recebido por calorosas palmas dos jornalistas.
Acompanhado dos atores Michel Joelsas (o garoto Mauro), Germano Hauit (Shlomo) e do produtor Fabiano Gullane, o diretor ouviu perguntas relacionadas sobretudo ao papel do futebol na vida brasileira, à hipótese de a Copa de 70 ter sido usada pela ditadura em seu favor e ao retrato que faz da comunidade judaica brasileira nas cenas de seu longa.
O diretor afirmou que "a Copa de 70 foi uma arma para o governo esconder o que estava acontecendo, sim", mas ressalvou que "isso não foi um privilégio desse governo e dessa ditadura". Hamburger afirmou discordar da idéia de que "o futebol é o ópio do povo", porque acredita que "no Brasil, o futebol tem uma força maior do que o governo e os regimes".
Depois de lembrar que a ditadura militar iniciada em 64 não foi a única que o Brasil conheceu, o diretor disse que "é bom lembrar as coisas que não foram boas, para não repeti-las".

Trilogia latina
Ao repórter estrangeiro que mencionou a coincidência temática de "O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias" com o chileno "Machuca", de Andrés Wood, Hamburger, 44, disse que seu filme forma "uma trilogia involuntária" com o de Wood e "Kamchatka", do argentino Marcelo Piñeyro, por tratarem os três da ditadura pela perspectiva de uma criança.
"Minha geração viveu a ditadura militar quando era criança. É natural que a abordássemos dessa forma", afirmou.
Joelsas teve de responder, se, assim como seu personagem, é um fanático por futebol. "Gosto bastante de futebol, mas não sou muito bom. Não (o suficiente) para ir para um time", disse, sob o olhar atento de sua mãe, na platéia.
O futebol foi o mote também da última pergunta, feita pelo moderador da entrevista, o italiano Vicenzo Bugno, que já havia mencionado no início suas dolorosas lembranças da final da Copa de 70, que a Itália perdeu para o Brasil. Bugno quis saber se Hamburger ainda se lembrava da escalação da seleção canarinho.
"Eu e quase todo mundo", disse o diretor, emendando com a citação dos 11 titulares do Brasil, de Félix a Rivellino. Em suma, a estréia de "O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias" no Festival de Berlim foi um belo gol.


Leia na Folha Online a cobertura da sessão de gala do filme brasileiro em Berlim



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