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Crítica/ "Vocês, os Vivos"
Andersson "envenena" longa para ressaltar as "verdades"
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
Uma impressão de falsidade paira o tempo todo sobre as imagens de
"Vocês, os Vivos". É como se a
larga experiência do diretor
sueco Roy Andersson no ramo
dos filmes publicitários se sobrepusesse à sua vontade de fazer cinema e condenasse seu
projeto de redesenhar um painel atualizado da comédia humana a se diluir numa estética
de vender tudo, menos verdades.
O próprio formato do filme
reitera essa impressão. Uma
sucessão de 53 esquetes cujas
imagens são milimetricamente
planificadas, a tendência a uma
comicidade gráfica cuja inspiração mais evidente é o cinema
de Jacques Tati e a presença de
tipos vizinhos da caricatura nos
levam a pressentir o pior.
Afinal, não poucas vezes algum "gênio" teve a ideia de saturar um filme com elementos
decorativos e confundiu "reinventar" o cinema com fazer um
bolo desses de festa de criança:
lindo e enjoativo.
À medida, porém, que a projeção de "Nós, os Vivos" avança,
torna-se mais sólida a compreensão de que Roy Andersson usa, sim, sua maestria no
campo da publicidade, mas para nos fazer consumir um produto envenenado.
Além do humor negro de algumas situações (um coitado
sonha ter destruído um conjunto completo de louças antigas num jantar e por causa disso é condenado à cadeira elétrica; uma mulher peleja para fazer a mãe, vítima de Alzheimer,
recuperar suas lembranças), há
sempre uma dose extra de melancolia nos tipos e queixas que
povoam a tela, emoção imprópria sob a ditadura do hedonismo vigente.
Nesse pacote, a caricatura
cumpre sua função enfática e
ganha no cinema uma estranha
dimensão, a meio caminho entre o desenho animado e o expressionismo pictural, com a
qual nos identificamos no exagero e no absurdo.
A estratégia de embalar esses
micro-retratos da miséria humana numa forma encantadora, em vez de amenizar o lado
trágico da nossa comédia, torna-a mais explícita.
Nessa apropriação da linguagem domesticadora com que a
publicidade embala nossos sonhos consumistas e embota
nossa visão noite e dia, "Nós, os
Vivos" deturpa o poder da farsa
e nos permite experimentar
um tanto de verdades.
VOCÊS, OS VIVOS
Produção : Suécia/Alemanha/ França/Dinamarca/Noruega, 2007
Direção : Roy Andersson
Com : Jessika Lundberg, Elisabeth
Helander e Björn Englund
Onde : Espaço Unibanco Pompeia 10
e Frei Caneca Unibanco Arteplex 5
Avaliação: ótimo
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