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Obra segue passos de maridos das Mães da Praça de Maio
"Padres de la Plaza", que será exibido no evento na terça-feira, resgata lembranças de pais de desaparecidos políticos durante regime militar argentino
SYLVIA COLOMBO
EDITORA DA ILUSTRADA
"Este é um bilhete de ônibus
daquele tempo", diz o fotógrafo
Jaime Steimberg, 85, enquanto
mostra uma desgastada carteira. Foi o único pertence do filho
Luis Pablo que lhe chegou às
mãos depois de o jovem militante comunista ser sequestrado no distante 1976, aos 22.
Steimberg era um dos dez
homens escolhidos para integrar "Padres de la Plaza", documentário sobre pais de desaparecidos políticos na ditadura
argentina que será exibido na
terça-feira no festival.
"Era" porque não sobreviveu
para ver o filme pronto. Morreu
poucas semanas depois de dar
um depoimento em que expunha um último desejo: "Quero
ser cremado, e que minhas cinzas sejam jogadas no rio da Prata, pois foi o que aconteceu com
Luis". O pedido foi atendido pelos familiares de Jaime.
O regime militar argentino
(1976-1983) foi responsável pelo desaparecimento de mais de
30 mil pessoas, segundo órgãos
de direitos humanos. No período, muitos presos políticos foram arremessados no rio.
O documentário é composto
por conversas que começam na
casa de cada pai. Depois, segue
durante caminhadas propostas
por eles, em lugares frequentados pelos filhos. No final, há
uma reunião na Praça de Maio.
"A ideia foi sempre partir do
individual para o coletivo, fazendo com que as trilhas convergissem no cenário onde sua
luta começou", conta o diretor
Joaquín Daglio, 34, que nasceu
durante o regime.
O local se transformou em
ponto de encontro político desde que as Mães da Praça de
Maio dele se apoderaram para
protestar pelo sumiço dos filhos, há mais de trinta anos.
As passeatas emotivas, nas
quais as mulheres carregam fotos dos jovens ficaram famosas
no mundo todo. As Mães -depois divividas em outros subgrupos- viraram uma referência para a luta por direitos humanos. Porém, até agora, ninguém havia feito a pergunta:
"Mas onde estão os pais?".
Em "Padres de la Plaza", eles
respondem. Uns dizem que ficavam espiando nas esquinas.
Outros, que tinham que trabalhar. E há, ainda, os que creem
que a imagem da mãe chorando
é mais comovente e, por isso, se
prestaria melhor à causa.
Mas é falsa a impressão de
que seus relatos possam ser
menos comoventes.
Há o caso de Rafael Beláustegui, 82, que teve nada menos do
que três filhos levados pelo regime. Martin, então com 19, foi
o primeiro a desaparecer, com a
namorada grávida, em 1976. No
ano seguinte, foram as vezes de
Valéria, 24, e Rafael, 22.
Alguns tiveram notícia sobre
os lugares para onde os jovens
eram levados. Como o oftalmologista Mauricio Brodsky, 85,
que soube que o filho Fernando
fora preso na temida ESMA
(Escola de Suboficiales de Mecânica da Armada, centro de
detenção em Buenos Aires).
Outros chegaram a recuperar
o corpo, como Julio Morresi,
79, que, em 1989, foi informado
de que os restos do filho haviam
sido identificados e que ele
morrera no próprio dia em que
fora sequestrado, em 1976, com
apenas 17 anos.
PADRES DE LA PLAZA
Direção: Joaquín Daglio
Quando: terça, 17h30, no CCBB-RJ; e
quarta, 15h, no Reserva Cultural, em SP
Classificação: não informada
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