São Paulo, sexta, 10 de abril de 1998

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Max exorciza o passado em "Soulfly"

MARCELO NEGROMONTE
free-lance para a Folha

Ex-integrante do Sepultura, Max Cavalera volta com banda e disco novos, exorcizando o passado e seus traumas: a separação do Sepultura, em 97, "uma facada no peito", e a morte, em 96, de Dana Wells, 21, filho de sua mulher, Gloria, "meu melhor amigo".
"Soulfly", o álbum, estará nas lojas de todo o mundo a partir do dia 20. Soulfly, a banda, formada por Jackson Bandeira, também conhecido por Lúcio Maia, guitarrista da Nação Zumbi, Roy Mayorga, baterista, e Marcello D. Rapp, baixista, sai em turnê pelos EUA e Europa daqui a duas semanas e deve passar pelo Brasil em agosto.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista que Max, de Phoenix, EUA, concedeu à Folha, em que fala de Chico Science, Sepultura, novo disco e seu futuro.
SOULFLY - "Queria uma palavra forte, que representasse o que estava tentando fazer. O mais próximo que cheguei foi Quilombo, que já tinha sido registrado. Recebi sugestões de todos, de Zyon, 5, meu filho, ao chefe da aldeia dos Xavantes, que sugeriu, por fax, Dimitri, que eu achei muito bonito, mas chegou depois de o nome já ter sido escolhido. Soulfly é o vôo da alma. Para mim significa as almas das pessoas que já se foram e que ficam ao nosso redor quando tocamos música."

O ÁLBUM - "Fiz o disco que sempre quis fazer, com uma liberdade que não tinha no Sepultura. É uma combinação do tribal com o moderno, em que utilizamos samplers, batidas de hip hop com hardcore e tambores da Nação Zumbi, que lembram os dos escravos. Quem acha que é um "Roots 2" está louco. Iria totalmente contra a tudo o que já fiz até hoje. Não é porque eu saí do Sepultura que vou negar as regras do meu próprio jogo. Foi um desafio fazer um disco mais ousado que o anterior."

NAÇÃO ZUMBI - "A Nação Zumbi participa em 70% do disco (com Gilmar e Jorge du Peixe nos tambores). O guitarrista Lúcio Maia, em praticamente todo o disco. Durante a turnê, que começa daqui a duas semanas, Logan, guitarrista do Machine Head, é quem acompanha a banda, porque Lúcio não pode. Sempre deixei claro que não "roubaria' o Lúcio da Nação Zumbi. A participação dele no disco foi mais do que especial. Chico Science deve estar muito orgulhoso do disco, porque foi totalmente dedicado a ele e à influência que ele trouxe para mim."

EXORCISMO - "Esse disco está mais espiritual e ligado a coisas indígenas e africanas, pelas quais tenho mostrado mais interesse. Basicamente o álbum tem dois lados: um é o pesado, como a morte do filho da Gloria (Dana Wells), um dos meus melhores amigos, e a separação do Sepultura, que foi uma facada no peito. Esse foi o lado do exorcismo disso tudo. O outro é olhar para o futuro, para onde minha música vai me levar, que são as experiências com a música indígena, africana e religiosa, com as mensagens da umbanda, que vêm acrescentar a minha música."

SAMPLERS - "Há vários samplers no disco que não pus nos créditos para evitar problemas de direitos autorais. Em "Prejudice' (Preconceito), tem um sampler de Bob Marley, tirado do vídeo "Time Will Tell', em que ele fala que não está do lado dos brancos nem dos negros, mas do lado de Deus. Em "Bumbklaat', Jimmy Cliff aparece falando muitos palavrões em "jamaicano', extraído do filme "Balada Sangrenta'."

O IRMÃO - "Infelizmente não falo regularmente com o meu irmão (Igor Cavalera), e a separação da banda nã é uma coisa bem resolvida. Eu amo o meu irmão, gosto muito dele, tenho muita saudade dele. O problema não é só entre mim e ele, envolve muita gente que não se gosta. Mas eu tenho muita esperança que o tempo vai cicatrizar essa ferida e sinto que vamos acabar tocando juntos, como começamos."
RECOMEÇO - "Foi muito difícil fazer um disco sem o Sepultura. Eu acho que só se consegue fazer uma obra que dure muito tempo quando a dor é canalizada. Por isso eu coloquei a frase do Chico no encarte: "a esperança é quando a dor presente nos faz tentar outra vez'. Essa frase simboliza tudo o que estou tentando fazer de novo, com a dor (com o Sepultura e a morte de Dana), mas resultando em esperança, e esse disco é cheio de esperança porque acredito que seja o futuro da minha carreira."
FUTURO - "Você acaba ficando vulnerável quando se separa de sua banda. Mas isso já passou. Provei para mim mesmo que tenho potencial, garra e atitude para conseguir fazer com outras pessoas, com a mesma intensidade e mesmo espírito, o que eu fazia com o Sepultura. O futuro que eu vejo para minha carreira é trazer cada vez mais elementos brasileiros, africanos, religiosos, de hip hop, de hardcore, de metal, uma mistura de tudo, da maneira mais honesta possível, sem ter medo, mostrando um outro lado da música pesada, com a qual as pessoas não estão acostumadas."

Disco: Soulfly Banda: Soulfly Lançamento: Roadrunner Quanto: R$ 18, em média


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