São Paulo, sexta-feira, 10 de maio de 2002

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CINEMA/ESTRÉIAS

"O VOTO É SECRETO"

Iraniano estréia depois de ser premiado na Mostra de SP

Babak Payami lança luz sobre fragilidades da política

SYLVIA COLOMBO
EDITORA-ADJUNTA DA ILUSTRADA

Uma jovem mulher, fiscal do governo iraniano, chega a uma ilha semideserta para coletar votos dos poucos eleitores que ali vivem. Desembarca numa praia vigiada por dois soldados -um negro, um branco- que se revezam em turnos para observar o nada no horizonte do oceano.
Um dos soldados (Cyrus Abidi) é destacado para passar o dia com a moça (Nassim Abdi), recolhendo votos e guardando-os numa grande urna de madeira.
Ele aceita a missão a contragosto. Primeiro porque não aceita receber ordens de uma mulher da cidade grande, depois por estar convicto de que nenhum tipo de administração eleita pode mudar a maneira como as coisas se dão naquele sítio remoto, habitado ou por contrabandistas ou por antigos clãs que se autogovernam.
"O Voto É Secreto", de Babak Payami, que estréia hoje no Brasil, é uma divertida alegoria sobre o confronto entre "civilização" e "barbárie", democracia e patriarcalismo, idealismo e descrença.
O filme levou prêmios nos festivais de Veneza, Roterdã e Londres, além de ter sido escolhido o melhor filme pela crítica da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
Os dois protagonistas passam o dia discutindo. Ela tenta convencê-lo de que o voto pode melhorar a vida de uma comunidade, que é importante que esta participe das decisões do governo, elegendo seus representantes. Ele, por sua vez, acha que bandidos e mulheres têm de ser enquadrados à única ordem que ele considera possível, aquela que é controlada por sua espingarda.
Aos poucos, ele se deixa contagiar pelo idealismo da moça. Entretanto, ambos percebem juntos a inadequação de tentar estabelecer uma discussão política num lugar onde não há sociedade civil.
Numa das cenas mais significativas, o soldado pára o carro em frente a um absurdo sinal vermelho, colocado no meio de um descampado. A mulher pede a ele que avance, pois não há nenhum outro veículo no horizonte. Ele fica confuso: "Você passou o dia dizendo que leis são importantes, agora quer que eu desobedeça".
O filme guarda semelhanças com "Terra de Ninguém", do bósnio Danis Tanovic, premiado com o Oscar de filme estrangeiro. Ambos mostram como reage um microuniverso humano obrigado -pela guerra ou pelo isolamento- a optar entre estabelecer um sistema de conduta próprio ou seguir as determinações da política de seus governantes.
O Voto É Secreto


Raye Makhfi     
Direção: Babak Payami
Produção: Irã, 2001
Com: Cyrus Abidi, Youssef Habashi, Nassim Abdi
Quando: a partir de hoje no Cineclube DirecTV e Frei Caneca Arteplex



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