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DANÇA/CRÍTICA
Mostra enfoca longevidade do artista e expressão coreográfica
INÊS BOGÉA
CRÍTICA DA FOLHA
Duas grandes questões, que
afinal se tocam, percorreram
a mostra "Movimentos Vol. 1": a
longevidade da vida cênica de um
dançarino e a capacidade de comunicação na dança. Criada pelo
Studio 3 e organizada em torno da
Cia. Sociedade Masculina, a mostra, que teve lugar ao longo da semana passada no teatro Alfa,
apresentou nomes conhecidos
como Luis Arrieta e Ivonice Satie,
grupos consagrados como Quasar e o Balé da Cidade e também
grupos mais novos, como a Companhia Jovem El Passo de Dança e
a própria Cia. Masculina. O que se
viu foi uma multiplicidade de estilos, de idéias e de formas, com resultados muito diferentes nas 17
peças apresentadas.
É sempre interessante ver a
Quasar dançar "Coreografia para
Ouvir", de seu coreógrafo residente, Henrique Rodovalho. A relação entre as palavras da música,
o caráter particular dos movimentos e o posicionamento dos
corpos no espaço aprofunda as
seduções da superfície, deixando
transbordar um interior rico de
sensualidade, sensação, consciência. O mesmo Rodovalho criou
"Chorando" para a Cia. Masculina -um grupo de cinco bailarinos, de técnica apurada. Os movimentos característicos do coreógrafo foram bem executados formalmente, mas a estranha sensação era que as informações não
passavam da epiderme da cena.
(Um risco secular da dança: como
garantir que belos movimentos
não se tornem vazios?)
Esse mesmo tipo de questão se
fez notar nas "Resenhas do Improviso", dançadas pela Cia. 2 do
Balé da Cidade, com direção de
Luiz Fernando Bongiovanni. A
peça emprega técnicas de improvisação, marcadamente do coreógrafo William Forsythe; o desafio,
aqui, talvez esteja em fundar unidades de linguagem no próprio
corpo.
A Cia. 2 apresentou também
"Ponto Final da Última Cena", coreografia de Sandro Borelli, interpretada por Mara Mesquita. Cada
gesto ali porta seu sentido, mesmo na amplidão do palco do Alfa,
onde a tensão coreográfica se perde um pouco.
A Cia. Masculina dançou também "Laços", de Deborah Colker.
Aqui o vigor dos movimentos característicos de Colker foi suavizado pela dinâmica da própria coreografia, que enfatiza a sobreposição dos corpos no espaço. Uma
coreografia simples, em que a
música ao vivo e o cenário são
partes fundamentais da obra. Mas
ficou visível que o grupo não estava tão fluente como poderia. Já
em "Saga", de Ivonice Satie, a Cia.
Masculina encontrou um pouco
mais de acento na execução de
uma coreografia que combina
gestos da linguagem clássica com
movimentos mais soltos -desde
gestos do dia-a-dia até impulsos
vigorosos do corpo no ar.
Cabe ressaltar que ao longo da
mostra também se apresentaram
dançarinos mais experientes, como Satie, Arrieta, Ruth Rachou e
Vera Lafer. A questão implicitamente posta aqui não é a da idade,
mas sim a da condição de um intérprete gerar sentido expressivo
através do movimento. Vale dizer: de um intérprete que busca
ou inventa virtudes para sustentar
o que cada corpo pode fazer. Se
não por outros motivos, a mostra
teve o valor de ressaltar tal lição.
A passagem de uma técnica de
um corpo a outro (de uma companhia a outra, no caso de Rodovalho) é só o exemplo mais evidente de algo que se revela na relação de cada corpo consigo. A
dança nos ensina muita coisas;
entre outras, a chance, real ou
imaginária, de não sermos estrangeiros em nosso próprio corpo.
Avaliação:
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