São Paulo, terça-feira, 10 de maio de 2005

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FOTOGRAFIA

Mostra reúne 37 obras do fotógrafo da Magnum na Leica Gallery; entre os retratados estão ícones do século 20

Elliott Erwitt expõe "falsas verdades" em SP

EDER CHIODETTO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

"Prefiro ser divertido a ser trágico", diz o fotógrafo Elliott Erwitt, 77, que inaugura hoje, com a mostra "Magic Hands", a Leica Gallery, em São Paulo, espaço destinado exclusivamente a exposições de fotografia, em evento que integra o 7º Mês Internacional da Fotografia na cidade.
O humor de fato é a marca registrada deste fotógrafo, filho de russos, que nasceu em 1928 em Paris e se mudou para os Estados Unidos ainda jovem. Erwitt ganhou sua primeira câmera aos 13 anos de idade. Por essa época viu numa revista uma fotografia de Henri Cartier-Bresson (1908-2004). "Foi uma revelação", diz. Decidido a ser fotógrafo, ganhou um prêmio num concurso de fotografia quando servia o Exército em 1951.
"Na verdade fiquei em segundo lugar, o que me fez pensar que eu devia melhorar ainda mais", contou em entrevista à Folha na última sexta-feira, momentos antes de iniciar um workshop para 14 pessoas que pagaram R$ 2.400 cada uma por três dias de troca de informações com ele.
Em 1953, após sair do Exército, Erwitt passou a integrar a equipe da agência Magnum, fundada em 1947 por Cartier-Bresson e Robert Capa (1913-1954). Em 1968, tornou-se presidente da agência, uma espécie de cooperativa que reúne até hoje a nata da fotografia documental (www.magnumphotos.com).
Na Magnum, Erwitt teve a possibilidade de viajar o mundo, acompanhado por sua inseparável câmera Leica, realizando reportagens sem nunca deixar de lado a fotografia de rua, uma obsessiva busca pela captura do surreal nos momentos mais prosaicos do cotidiano, inspiração clara do mito que o fez descobrir a fotografia e que depois se tornou seu amigo: Cartier-Bresson. Assim sendo, o rigor geométrico nas composições também é uma de suas marcas: "A busca da organização geométrica na fotografia é um pressuposto básico, uma busca visual, não intelectual", diz.
As imagens mais conhecidas de Erwitt mostram cachorros em várias situações, geralmente de forma humanizada, menos pelo olhar dele do que pela forma como as pessoas se relacionam com seus animais domésticos.
"Nunca havia fotografado cachorros de forma consciente, até que há alguns anos percebi que havia muitos deles nas minhas folhas de contato", diz.
Mas por que cachorros? "Vejo cachorros como pessoas, só que com mais cabelos. Eles reagem como seres humanos com a vantagem de nunca reclamarem por estarem sendo fotografados", conta e solta uma gargalhada. E continua: "Para conseguir uma boa foto dos caninos é preciso interagir com eles. Muitas vezes começo a latir na busca dessa interação", completa. Certa vez o latido emitido pelo fotógrafo soou como uma injúria aos ouvidos de um cachorro que lhe mordeu a perna. A reunião das imagens de cachorros gerou um de seus 18 livros publicados até agora: "Dog Dogs" (Phaidon, 1998).

Dedos célebres
A mostra "Magic Hands", que chega agora a São Paulo, no entanto, traz um outro recorte do vasto arquivo de imagens de Erwitt: "Certa vez um editor estava olhando meu arquivo e percebeu que as mãos sempre eram muito expressivas nas minhas fotos, daí surgiu essa exposição", conta.
Entre as 37 fotografias que compõem a mostra estão retratos de ícones do século 20 como o papa Pio 12 (1957), Fidel Castro (1964), Richard Nixon e Nikita Khrushchev (1959), entre outros. O retrato tomado desses dois últimos líderes mostra o exato momento em que Nixon, durante conversa informal, coloca seu dedo indicador sobre o peito de Khrushchev.
"Foi um gesto rápido e banal, típico de quando as pessoas estão conversando", conta Erwitt. No entanto, anos mais tarde, durante campanha presidencial sob os ecos da Guerra Fria, a equipe de Nixon utilizaria tal imagem, sem autorização do fotógrafo, para fortalecer a idéia de que o candidato seria mais linha-dura que Kennedy em relação aos russos.
"Nixon perdeu a eleição, eu briguei para receber meus direitos e aprendi de uma vez por todas que na maioria do tempo a fotografia nos mostra falsas verdades dos fatos. Todo fotógrafo de imprensa precisa ter muita responsabilidade", diz.
"Veja o caso de George Bush. Ele se reelegeu basicamente criando uma imagem ilusória sobre ele mesmo, manipulando a mídia e, sobretudo, as imagens sobre o seu governo. Ele é mestre em imagens-show", completou.
A Leica Gallery, que será inaugurada hoje com a mostra de Erwitt, é apenas a sétima do mundo e passará a fazer parte do calendário de mostras de qualidade com itinerância entre essas galerias. A intenção dos organizadores paulistanos é poder também inserir fotógrafos brasileiros nesse circuito.


Magic Hands
Quando:
abertura hoje, para convidados, às 19h30. A partir de amanhã até 28 de maio, de seg. a sex. das 10h às 19h; dom., das 12h às 16h
Onde: Leica Gallery (r. da Mata, 70, sobreloja, Itaim Bibi, SP, tel. 0/xx/11/ 3079-0300)
Quanto: entrada franca
Mais informações: www.elliotterwitt.com


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