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CRÍTICA
Empolgações do arrojo e da delicadeza
INÊS BOGÉA
ENVIADA ESPECIAL AO RIO
Em "4 por 4", nova coreografia
de Deborah Colker, os gestos
interagem com o cenário, compondo formas que desafiam a
gravidade e o tempo. Cenário e
tanto: obras de Cildo Meireles,
Chelpa Ferro, Victor Arruda e
Gringo Cardia, que acolhem e desafiam os bailarinos, atualizando
em grande estilo a visão de Colker
da dança como espetáculo.
Crítica possível: "espetáculo" é
pouco. O sentido se esgota nas
formas. Mas seria injusto exigir
que a companhia não fosse o que
é, e como é. O controle do tempo
permanece crucial para esse sucesso: cada quadro oferece uma
surpresa e termina antes que a
imagem se trivialize.
Uma exceção é "Povinho", com
cenário de Arruda. A dança brinca, aqui, autocomplacentemente,
com a descoberta do corpo. Aposta na simplicidade -recortes de
gestos que se sucedem-, mas os
desenhos parecem pouco para o
muito que se quer dizer. (Mesma
restrição que se pode fazer à música eletrônica de Monoaural,
Berna Ceppas e Kassin.)
Já em "Cantos", dialogando
com Meireles, Colker monta uma
sucessão de poses, que não duram
mais do que segundos -suficientes para encenar o desafio da gravidade. A materialidade das esculturas só aumenta a leveza dos corpos. Mas o ponto forte da noite é
"Mesa", centrada no trabalho do
Chelpa Ferro. A mesa tem uma
esteira rolante, onde um corpo
passa pelo outro. Suas figuras, às
vezes imóveis, como se levadas
pelo próprio tempo, cruzam o
palco uma única vez. Os corpos
fazem contraponto à engrenagem
exposta da mesa, num sugestivo
limite da alegoria.
No mesmo espírito, Colker toca,
ela mesma, com habilidade doméstica, um movimento da "Sonata K. 331" para piano, de Mozart (1756-91). Enquanto isso,
duas bailarinas dançam sobre as
pontas com virtuosismo total. E o
palco vai sendo preenchido pelos
90 "Vasos" de Gringo Cardia, entre os quais vêm dançar os bailarinos, transformados em alegorias
vivas do controle e da delicadeza.
Colker tem conquistado platéias mundo afora com espetáculos de rigor plástico e boa dose de
aventura. "4 por 4" leva adiante
essa concepção, apostando nas
grandes imagens e no arrojo dos
bailarinos, mais do que propriamente na invenção coreográfica.
Encanta e empolga -dois verbos
fortes, que merecem ser declinados com a devida medida de reconhecimento.
A crítica Inês Bogéa viajou a convite da
produção do evento
4 por 4
Onde: teatro Alfa (r. Bento Branco de
Andrade Filho, 722, São Paulo, tel. 0/xx/
11/5693-4000)
Quando: de hoje a sábado, às 21h;
domingo, às 18h
Quanto: de R$ 20 a R$ 50
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