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CRÍTICA QUADRINHOS
"Cachalote" cria estilo gráfico de alto nível
Gênero sem tradição no Brasil, HQ de aventura ganha ânimo com trabalho de Daniel Galera e Rafael Coutinho
ZIRALDO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Venho do tempo em que o
desenhista de HQ se assustava se alguém o chamasse de
artista. E não entendia a razão pela qual pudesse ocorrer a esse admirador a ideia
de fazer uma exposição de
seus trabalhos.
Sou do tempo da chamada
época de ouro do gênero, de
quando a HQ começava a se
transformar num dos símbolos maiores da chamada cultura de massa (sem ter a menor ideia de que isto pudesse
vir a significar).
Alguns de nós ainda estão
por aí. Alvaro de Moya, por
exemplo, que foi um dos organizadores da primeira exposição global de originais
da HQ mundial -ou seja, do
comic americano- pode
confirmar o susto que alguns
dos desenhistas convidados
-entre eles, Hal Foster, Alex
Raymond, Burne Hogarth-
levaram quando o convite
chegou às suas mãos: "Exposição??? Mas nós somos apenas desenhistas de comics".
E mandaram seus lindos
originais para o Brasil. Alguns que, no mercado americano de arte, valem hoje alguns milhares de dólares.
Estes artistas maravilhosos e seus quadrinhos voadores encantavam os jovens
brasileiros daquele tempo.
PIONEIRISMO
Os vocacionados, aqui no
Rio, foram para os braços
pioneiros de Adolfo Aizem
fundar o Suplemento Juvenil. Mas a HQ de aventura
não progrediu no Brasil como se sonhava.
E, então, as agências de
publicidade, que ainda usavam os chamados arte-finalistas para desenhar seus
anúncios, absorveram o talento dos mais capazes, como Fernando Dias da Silva,
por exemplo, que Alex Raymond mandou chamar e que
foi para os Estados Unidos.
Mas não fui convidado pela Folha para contar a história da HQ no Brasil, mas para
fazer a resenha do "Cachalote" de Daniel Galera e Rafael
Coutinho.
Devo ter estourado meu
espaço, mas quero lembrar
que a semelhança dos dois
tempos -o meu e o dos meninos Daniel e Rafael- está em
que o Brasil não criou espaço
em sua cultura para desenvolver uma indústria de HQ
de aventura própria, apesar
do fantástico, incrível, inacreditável talento de muitos
dos nossos jovens artistas de
hoje e de tempos recentes.
INFANTIL
A HQ nacional só adentrou
o universo da cultura de massa no gênero que inclui o locutor que vos fala e o Mauricio [de Sousa]: a HQ infantil.
Que acabou no mundo, sobrevivendo apenas aqui,
com o Mauricio, e na revista
"Topolino", na Itália.
O grande mistério está em
que, sem um mercado de trabalho realmente compensador, tenhamos visto desenvolver-se no Brasil artistas
tão maravilhosos quanto os
americanos, franceses, espanhóis e argentinos.
Eu levo um susto quando
os descubro. Como fiz agora,
lendo a muito bem bolada
aventura criada pelo Daniel e
desenhada, primorosamente, pelo Rafael.
Um é um dramaturgo -ou
roteirista- para Billy Wilder
nenhum botar defeito, e o outro, um ilustrador cujo desenho consegue uma linguagem gráfica de altíssimo nível, bom demais para uma
exposição de arte. Isto sem
que ele se assuste se lhe fizerem um convite para este fim.
ZIRALDO é desenhista e autor de "O
Menino Maluquinho" (Editora
Melhoramentos)
CACHALOTE
AUTORES Daniel Galera e Rafael
Coutinho
EDITORA Companhia das Letras
QUANTO R$ 45 (280 págs.)
AVALIAÇÃO ótimo
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