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CRÍTICA
Personagem parece ter saído de um filme de Woody Allen
MARCELO PEN
CRÍTICO DA FOLHA
A judia Lila Moscowitz parece heroína de um filme de
Woody Allen. Com um toque almodóvariano. Prestes a fazer 35
anos, não consegue concluir seu
último livro de poesias. Vive num
minúsculo apartamento do Village, na companhia de dois fantasmas. Faz análise com um terapeuta "drag queen". Escreve versos
pornô na forma de sonetos. E foge
do amor como o diabo da cruz.
Sua grande paixão foi o cartógrafo Max Schirmer. Max é um
alemão naturalizado, com antepassados nazistas. Para Lila, que
se agarra ao judaísmo como a
uma bóia existencial, a relação só
podia estar fadada ao fracasso.
Agora namora um anglicano divorciado que fica aflito se a mulher lhe serve vinho branco na taça de vinho tinto. A perspectiva
não é muito animadora, mas Lila
se esforça. Um pouquinho.
Pode parecer comédia e é, até
certo ponto. Mas é igualmente
um retrato bastante lúcido de
uma mulher em profunda contradição, procurando ser feliz sem
muito sucesso.
Lila tenta harmonizar termos
dessemelhantes, como sua "pornografia ... em terza rima". O estado de "poesia pura" representa a
união desses opostos, uma condição ideal a que aspira e da qual se
vê apartada.
Os nomes dos capítulos, extraídos da poética -dissonância,
verso livre, heptâmetros etc.-,
nem sempre se encaixam nos textos, funcionando mais como um
contraponto irônico do que um
mote consistentemente glosado.
Ainda bem. O forte da autora não
está no discurso abstrato, mas no
modo como descreve as emoções.
Com humor, mas também com
uma boa dose de lirismo.
A tradução deixa a desejar. Leis
não são "quebradas", mas infringidas; não falamos em "pecados
alegados", mas pretensos ou supostos; a expressão "in the long
run" significa "afinal de contas" e
não "numa longa corrida"; dizemos os sem-teto e não os "sem-casa" e por aí vai.
Seria ótimo se as editoras aumentassem seus pagamentos para obter versões mais esmeradas ou tradutores mais gabaritados. Os leitores "alegados", "numa
longa corrida", agradecem.
Poesia Pura
Autora: Binnie Kirshenbaum
Tradutor: Lourdes Menegale
Editora: Record
Quanto: R$ 33 (242 págs.)
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