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FESTIVAL
Eletronika tem muitos debates, mas poucas soluções
DIEGO ASSIS
ENVIADO ESPECIAL A BELO HORIZONTE
"Exija música ao vivo." Tirada
de seu contexto oficial, a frase no
telão do Eletronika, quinta edição
do festival encerrado no domingo
em Belo Horizonte, reflete bem os
paradoxos da música e de sua indústria nesses tempos.
Quem foi que disse que DJ tocando não é "ao vivo", que computador não é instrumento e que
imagem não é som? "O papel da
arte é criar ainda mais tensão nessa cultura [do artista romântico,
do suporte único etc.] que já está
se esfacelando", resumiu Eduardo de Jesus, professor da PUC-MG e participante de um dos
muitos debates promovidos nos
quatro dias do evento.
E as tais tensões surgiram a cada
instante. Ora com o rapper De Leve fazendo apologia do "funk piratão", ora com o diretor do festival alemão Transmediale, Remco
Shcuurbies, declarando e exibindo publicamente a nova "versão"
que fez para o clipe de Britney
Spears -o artista diz que quer
"ver o circo pegar fogo", mas até
agora não foi procurado.
Por outro lado: se a onda é o digital, por que não voltar ao analógico, adicionando umas cordas
aqui, uma percussão ali e uns
brinquedinhos acolá? Quando tudo o mais parece eletrônico, a cereja do bolo é o orgânico.
Assim fizeram não só os recém-chegados do Digitaria, Labo e M.
Takara, como também veteranos
como Dolores e Aparelhagem
(agora devidamente afinado) e a
dupla Marky e XRS, uma das atrações mais aguardadas do sábado.
Diante da reação do público, quase religiosa, ao ver os ídolos do
d'n'b é difícil não pensar na legitimidade do tal "ao vivo".
Por fim, mesmo a justaposição
do discurso engajado do hip hop
com o oba-oba dos mais "moderninhos" não deixa de ser outro foco de tensão. Justiça seja feita, foram os primeiros que salvaram
esta edição de um fracasso de bilheterias -mudança de maio para agosto e falta de divulgação,
culparam os organizadores.
Mas, ao contrário de maio de
2003, quando Elen Alien e Rubin
Steiner, então ilustres desconhecidos, lotaram e levantaram a mesma pista do Marista Hall, desta
vez divididas em dois palcos, algumas atrações acabaram prejudicadas. A dupla norte-americana
Gold Chain, por exemplo, que
também teve uma passagem discreta por São Paulo, foi literalmente ouro para poucos.
O quórum baixo também enfraqueceu alguns dos debates, realizados na sexta, sábado e no domingo na Casa do Conde. Insuficientes em apontar soluções possíveis (e as há?) para o futuro da
indústria musical, os encontros
deixaram uma importante pergunta no ar: até que ponto os artistas estão dispostos a encarar a
revolução digital não apenas como uma ferramenta mas como
uma revisão de paradigmas em si?
Posso impedir que sampleiem a
minha obra para quais fins sejam
se eu sempre fiz o mesmo com a
música dos outros?
Citando licenças como a Creative Commons, que permite ao autor liberar determinados usos de
suas obras, e os projetos de centros de tecnologia em comunidades carentes de todo o país, o advogado Caio Mariano disse que o
brasileiro não está sabendo fazer
uso do que já tem na mão.
"Grande parte não sabe o poder
que tem; poucas propostas apareceram", contou, explicando que o
projeto, apoiado pelo Ministério
da Cultura, promete a liberação
de até R$ 20 mil para a construção
de estúdios de produção.
O Eletronika talvez fosse a chance de multiplicar algumas dessas
idéias. Não foi.
O jornalista Diego Assis viajou a convite
da Telemig Celular
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