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Brasil é dos países com menos salas no mundo
Circuito elitizado limita produções populares, como "Se Eu Fosse Você 2"
Público de classe C, habituado a consumir DVDs piratas e ver televisão, só vai ao cinema estimulado por promoções e sucessos
DA REPORTAGEM LOCAL
Numa das cenas do filme
uruguaio "Gigante", em cartaz
em São Paulo, o vigilante de um
supermercado acompanha os
passos de sua amada, faxineira
no mesmo emprego, e, ao segui-la, vai parar num pequeno
cinema de bairro. Na produção
brasileira atual, tal sequência
soaria inverossímil.
É que o cinema no Brasil, ao
ressuscitar após o fim da Embrafilme (1990), tomou forma
elitista. No circuito e na produção. Havia, em meados da década de 1990, três vezes menos
salas do que na década de 1970.
Os cinemas que cerraram as
portas foram, sobretudo, os de
periferias e pequenas cidades.
Numa lógica "ovo-e-galinha",
também os filmes, salvo exceções, como Xuxa e "O Auto da
Compadecida", deixaram de
ter esse público como alvo.
O alarme tocaria em 2003.
Para surpresa dos donos dos
confortáveis multiplex, a sala
que mais vendeu ingressos para
"Carandiru" foi o Cine Ipiranga, no centro de São Paulo, habitualmente às moscas. Nesse
mesmo ano, "Maria, Mãe do Filho de Deus" registraria um feito raro: teve maior renda durante a semana, quando os ingressos são mais baratos, do
que nos finais de semana. "Faltam cinemas para a classe C e
também em cidades pequenas", diz Walkiria Barbosa, da
Total Filmes, produtora de "Sexo Amor e Traição" e "Se Eu
Fosse Você". Ela tira um exemplo da manga. "Se Eu Fosse Você" fez, em Macaé (RJ), 1,5 mil
espectadores. Três anos mais
tarde, após a abertura de um
novo complexo na cidade, "Se
Eu Fosse Você 2" vendeu mais
de 10 mil ingressos. "Há uma
demanda reprimida. Mas, para
tirar o público da inércia, o filme tem que ser um evento."
Eduardo Vaz, dono de um
circuito de 60 salas, quase todas em bairros periféricos das
capitais, como Bangu, no Rio,
nota que o público anseia por
promoções. Não à toa, ele criou
a "Terça Mais", a R$ 5, e a
"Quinta do Beijo", que deixa o
casal entrar com um só ingresso -desde que se beije. "Nosso
cliente não tem a cultura de ir
ao cinema. Para atraí-lo, temos
que criar programas de acesso e
ter filmes de sucesso. Não
adianta oferecer um produto
de segunda linha. A classe C
também quer ver 3D."
Aí é que se (re)fazem os nós.
Os cinemas mais afastados têm
dificuldades até mesmo para
conseguir cópias dos lançamentos. "Cheguei a receber filme um mês depois de ter estreado em São Paulo", diz Flavio Panzenhagen, do interior
do RS. Para resolver esse problema, o projeto do governo,
pelo que a Folha apurou, inclui
a instalação de uma fábrica de
projetores digitais na Zona
Franca de Manaus. O custo do
equipamento cairia de R$ 250
para R$ 150 mil e, com a digitalização do circuito, as cópias
deixariam de ser empecilho.
Outra barreira, que o projeto
do Carrefour pretende quebrar, é a do ambiente. "Parte do
público ficou com medo de entrar no cinema. É preciso abrir
salas onde essas pessoas já
vão", diz Oliveira. "Na pesquisa
que fizemos, todos mostraram
desejo de ter um cinema perto
de casa", completa Thierry
Perrone, sócio da empreitada.
A quem imagina que a tendência à diminuição de salas é
mundial, vale uma comparação. Nos EUA, há uma sala para
cada 7,5 mil habitantes; na
França, o índice é de 11 mil e, na
vizinha Argentina, de 40 mil. O
Brasil, com uma sala para cada
92 mil pessoas, tem uma das
piores médias do mundo. "Sem
a abertura de mais salas, o cinema, no Brasil, vai ficar onde está", finaliza Perrone.
(ANA PAULA SOUSA)
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