São Paulo, sábado, 10 de setembro de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

livros

TRÉPLICA

Magnoli vê stalinismo em qualquer canto

Sociólogo não realiza a intenção de oferecer narrativa anticomunista do século 20 em 'O Mundo em Desordem'

OSCAR PILAGALLO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Demétrio Magnoli, em réplica publicada sábado passado (3/9) sobre a minha resenha de "O Mundo em Desordem", do qual é coautor, afirma desconfiar que divergi da tese do livro baseando-me numa interpretação stalinista da história do século 20.
Vejamos. O livro, em resumo, aborda o período a partir da tensão entre os ideais de liberdade e igualdade, para ele excludentes, no limite. Meu argumento central é que a obra desconsidera a convergência possível entre os dois campos ideológicos.
Desconfio que enxergar stalinismo em tal colocação tem a ver menos com a lógica do que com a arte do duplipensar orwelliano.
Na réplica, Magnoli oferece uma chave de leitura para seu livro. "Fizemos uma história anti-Hobsbawn", diz, em referência ao historiador britânico para quem a União Soviética, involuntariamente, salvou o capitalismo.
Hobsbawn é um stalinista empedernido. Defende o pacto soviético-nazista, rejeita o rótulo de totalitário ao regime bolchevique e atribui sobretudo ao Exército Vermelho a vitória contra Hitler.
Nem todas as análises do historiador, no entanto, estão subordinadas a convicções ideológicas.
Em "Era dos Extremos", por exemplo, a conclusão de que o medo do apelo do comunismo junto aos trabalhadores incentivou reformas políticas e sociais na Europa do pós-guerra nada tem de stalinista, embora encerre a admiração do autor pelo regime implantado com a Revolução de Outubro.
Afirmar que tais reformas salvaram a democracia parlamentar, como quer Hobsbawn, é certamente um exagero, mas não menor do que lhes negar a remota origem comunista, como parece sugerir Magnoli.

AQUÉM DA AMBIÇÃO
O sociólogo se queixa de que passei ao largo de seu método. Este seria, suponho, a demonstração, por meio de análises interconectadas, de que os ideais herdados da Revolução Francesa permeiam a história do século 20.
Se é disso que se trata, o livro fica aquém da ambição. Alguns fios narrativos soltos embaralham a visão do conjunto. O que seria um método se reduz a uma intenção irrealizada. É por isso que "O Mundo em Desordem" não ombreia com "Era dos Extremos", que Magnoli elege como seu antípoda.
Mas não gostaria de terminar numa nota ácida. Afinal, o polemista foi singelo ao lembrar que sou autor de um livro sobre Roberto Carlos e mencionar a letra que o compositor escreveu para um Caetano Veloso no exílio.
Termino, pois, com o verso de Caetano para Roberto citando a distopia totalitária do escritor George Orwell: "Tudo certo como dois e dois são cinco".

OSCAR PILAGALLO, jornalista, é autor de "A História do Brasil no Século 20" (Publifolha).



Texto Anterior: Escritor não deve pensar em filme, diz Levy
Próximo Texto: Crítica romance: Eduardo Mendoza une o erudito ao chulo em nova paródia policial
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.