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CINEMA/ESTRÉIA
Pixar revê dilemas que extrapolam as páginas das HQs
"Os Incríveis" faz piada das fraquezas dos heróis
Divulgação
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Os super-heróis Sr. Incrível e Mulher-Elástica em "Os Incríveis" |
DIEGO ASSIS
DA REPORTAGEM LOCAL
É só mais um dia na vida do Sr.
Incrível: salvar um gatinho da
árvore pela manhã, ajudar a polícia a prender uns assaltantes de
banco em seguida, impedir uma
tentativa de suicídio e o descarrilhamento de um trem à noite e,
acima de tudo, chegar a tempo
para o casamento. O seu próprio.
Sim, estamos no bom e velho
-para quem já folheou as HQs
ou pelo menos assistiu aos desenhos e seriados- universo dos
super-heróis, seres superpoderosos capazes de levantar carros
com uma só mão, correr à velocidade da luz, ficar invisíveis, cada
um a seu modo, mas com uma
coisa em comum: jamais vão conseguir levar uma vida "normal".
Essa é a premissa de nove entre
dez HQs de super-heróis, do menino adolescente que descobre
que "grandes poderes trazem
grandes responsabilidades" em
"Homem-Aranha", passando pela escola de mutantes do professor Xavier em "X-Men", até a
mais adulta "Watchmen", um
dos maiores cânones do gênero,
em que Alan Moore retrata a decadência dos mascarados.
Baseada nessa mesma idéia, a
de que num dia o governo baixa
um decreto que proíbe a ação dos
super-heróis, a animação "Os Incríveis" chega hoje ao Brasil depois de acumular vultuosos US$
225 milhões em apenas cinco semanas nos Estados Unidos.
A superprodução da Pixar, penúltima do estúdio de John Lasseter em parceria com a Disney,
conta a história de uma família de
heróis lutando para se equilibrar
depois da aposentadoria forçada
imposta pelo governo dos EUA.
O novo cotidiano de Beto Pêra
(Craig T. Nelson), o outrora hiperativo e esbelto Sr. Incrível, se resume agora a vender apólices para os clientes da Seguros S.A. e
cuidar para que os vizinhos não
percebam sua identidade secreta.
A dona-de-casa Helena (Holly
Hunter), conhecida no passado
como a Mulher-Elástica, tenta
justificar aos filhos, Flecha (Spencer Fox) e Violeta (Sarah Vowell),
por que não devem sair por aí
usando seus poderes.
Num mundo onde todos são especiais, a única verdade é que ninguém é especial, raciocina o garoto que, para não dar bandeira de
sua supervelocidade, é sempre
obrigado a chegar em segundo lugar nas corridas da escola.
Por trás da aparente ingenuidade, a animação de Brad Bird, espécie de "os Simpsons encontram
o Quarteto Fantástico", propõe
uma reflexão sobre a natureza do
discurso liberal em que, mais que
os mesmos direitos, todos devem
ter a mesma postura em relação
ao mundo. Diferenças? Que diferenças? Somos todos filhos de
Deus, acreditamos na democracia
e quem estiver contra que vá viver
numa ilha distante bem longe dos
nossos olhos...
E é isso que faz o Gurincrível,
quando criança fã número 1 do
Sr. Incrível, hoje o impiedoso vilão Síndrome (Jason Lee), que,
apesar de não ter nenhum poder,
foi capaz de criá-los em laboratório e agora arquiteta sua revanche
contra os super-heróis que no
passado o desprezaram. "Quando
todos forem super-heróis, então
ninguém será super-herói."
Enfim, essa mesma temática
que perpassa toda a aventura de
"Os Incríveis" talvez também
possa ser estendida ao momento
pelo qual passa a indústria da animação atual. Os "poderes" para
criar uma animação digital de
qualidade estão todos aí, cada vez
mais acessíveis e baratos.
Pioneira no estilo de computação gráfica com "Toy Story (95),
hoje a Pixar não é mais tão super
assim. Com o sucesso de filmes
como "Shrek" e "A Era do Gelo",
estúdios como DreamWorks e
Blue SkyStudio mostraram que
também têm bala na agulha. E
quem será(ão) o(s) mocinho(s)
dessa nova história?
Sem dúvida, os que souberem
usar bem a ferramenta a serviço
de um bom roteiro. Poder modelar os personagens por computador, suas feições e, mais importante, seus exageros é hoje o grande trunfo do gênero diante das
produções "tradicionais" da indústria do entretenimento.
Fala-se com crianças por meio
do traço, mais imediato, e com os
adultos, por meio das diversas referências ao universo do cinema e
da cultura pop -é hilário o argumento da costureira de fantasias
Edna Moda para tirar a capa do
uniforme do Sr. Incrível: "Você se
lembra de Thunderhead? Um cara legal, bom com as crianças. 15
de novembro de 1958. Tudo bem,
mais um dia salvo... até que sua
capa se enroscou num míssil!".
Ainda no quesito pop, Samuel
Jackson como o herói Gelado
também rende diálogos impagáveis: "Super-heroínas vivem tentando lhe contar suas identidades
secretas. Elas acham que vai ajudar a fortalecer a relação".
A ação é... incrível e os cenários,
belíssimos, mas é justamente no
que tem de mais humano, de menos superpoderoso, que o filme
da Pixar nos pega de surpresa.
Os Incríveis
The Incredibles
Direção: Brad Bird
Produção: EUA, 2004
Quando: a partir de hoje nos cines
Anália Franco, Interlagos e circuito
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