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ANÁLISE
"Homem mau" fez sua fama
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
"Estudei arte dramática
em Yale, EUA, e todo meu
Shakespeare tem sido gasto em
filmes lamentáveis." A frase ilustra bem a insatisfação de José
Lewgoy com seu trabalho.
No entanto, Lewgoy deixou
uma marca profunda no cinema
brasileiro antes de morrer, ontem,
aos 82 anos. Foram mais de 90 filmes em mais de 50 anos de uma
carreira iniciada em 1949.
A frase acima, reproduzida pela
"Enciclopédia do Cinema Brasileiro" assinala o abismo entre as
modestas ambições de boa parte
do cinema brasileiro e a vocação
internacional desse filho de pai
russo e mãe americana.
Nascido em Veranópolis (RS),
cidade de imigração predominantemente italiana, em novembro de 1920, já nos anos 40, em Porto Alegre, tornara-se tradutor
da célebre editora Globo e um
próximo de seu "staff", composto
por intelectuais como Mário
Quintana e Erico Verissimo.
Foi Verissimo, aliás, que levou o
adido cultural americano para ver
uma montagem amadora em que
Lewgoy atuava. E foi por influência do adido que ele ganhou uma
bolsa para estudar arte dramática
na Universidade de Yale, entre
1947 e 1949.
É compreensível que não lhe
bastassem os filmes que fazia, embora alguns deles tenham consolidado, para sempre, sua fama de
"homem mau" por excelência do
cinema brasileiro, entre eles "Carnaval no Fogo" (1949), de Watson
Macedo, e "Matar ou Correr"
(1954), de Carlos Manga.
Não é de espantar que tenha
tentado fazer carreira na França,
entre 1954 e 64, apesar de ter estudado nos EUA: sua maior influência eram atores franceses clássicos, como Jean Gabin ou Jean Marais. Atores que representavam e
não tinham medo de parecer que
representavam, como dizia (o que
talvez explique a fama de cabotino que acompanhou Lewgoy ao
longo de sua carreira).
De volta ao Brasil após tentar
por dez anos carreira na França, a
partir de 1954, Lewgoy mostra
plenamente sua versatilidade.
Trabalha com igual desenvoltura com realizadores do cinema
novo, como Glauber Rocha
("Terra em Transe", de 1966) ou
Roberto Santos ("As Cariocas",
de 1967), em filmes de extração
popular, como os da série de Roberto Carlos, realizados por Roberto Farias, ou "Os Paqueras"
(1968), de Reginaldo Farias. Mas
também pode ser visto em trabalhos de cineastas experimentais,
como Júlio Bressane ("Tabu", de
1982, "Os Sermões", de 1989).
Como que para coroar sua ambição internacional, nos anos 80
trabalha com o alemão Werner
Herzog em "Fitzcarraldo" (1982)
e "Cobra Verde" (1987). Mas a
marca mais evidente de seu carisma está, ironicamente, nas velhas
chanchadas da Atlântida.
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