São Paulo, sexta-feira, 11 de fevereiro de 2005

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CINEMA

Filme sobre a África Central do diretor francês Régis Wargnier, o mesmo de "Indochina", é maniqueísta e previsível

Berlim começa com o frágil "Man to Man"

Pawel Kopczynski/Reuters
Os jurados Nino Cerruti, Andrei Kurkov, Franka Potente, Bai Ling, Ingeborga Dapkunaite, Wouter Barendrech e Roland Emmerich


FABIO CYPRIANO
ENVIADO ESPECIAL A BERLIM

Há uma cena em "Man to Man", o filme que abriu, ontem, a 55ª edição do Festival de Cinema de Berlim, que justifica sua presença. É quando Jamie, um cientista do século 19, na Escócia, mostra dois pigmeus, capturados na África Central, em pleno zoológico da cidade, como se fossem seres não-humanos, e encena com eles uma situação na jaula. Lá, acaba sendo dominado pelos pigmeus, como se o caucasiano fosse, ele também, uma espécie primitiva.
A tal cena leva uma hora e 35 minutos para ocorrer e, até então, a nova produção do diretor francês Régis Wargnier, que realizou o "Indochina" (92), desenvolve-se de maneira um tanto previsível e sem surpresas.
O tema, o preconceito do avanço civilizatório europeu sobre espécies supostamente inferiores, já foi explorado de forma brilhante por Michel Gondry, em "Natureza Quase Humana" (2001), com ironia e sem apontar dualismos entre bem e mal, o que Wargnier não consegue. No filme, os brancos são os exploradores "selvagens", e os pigmeus, os puros.
Tudo bem que se trata do século 19, da era vitoriana no Reino Unido, mas o personagem "branco", o cientista Jamie (Joseph Fiennes) é um desses típicos heróis, que só tem qualidades, lutando só em uma sociedade que busca o controle total, e, para tanto, não se envergonha de usar o preconceito.
"O filme não constrói uma tese contra o preconceito. Não acredito em categorias, cada filme é sobre ele mesmo", disse Wargnier em entrevista coletiva. Vejamos.
Em 1870, Damien, o cientista, e Elena Van den Ende (Kristin Scott Thomas), uma explorada que trazia animais africanos para zoológicos europeus, embarcam para a África do Sul em busca de pigmeus. A tese do cientista é que eles seriam o elo perdido entre os macacos e os seres humanos. Na África capturam dois pigmeus e os levam para a Escócia.
Lá, junto com outros dois cientistas, interpretados por Hugh Bonneville e Iain Glen, Damien analisa os pigmeus, chegando a conclusão que ambos possuem "inteligência e sensibilidade", portanto são humanos, o que é contrário ao que pensam seus colegas. Começa, então, uma série de brigas e perseguições, que culminam na cena descrita acima.
A partir de então, os pigmeus, os atores africanos Lomana Boseki e Cécile Bayiha, são tratados como "seres normais", até que os selvagens cientistas entram novamente em ação, provocando um final que mescla um momento triste com outro reconfortante.
Foi um começo morno e desestimulante na Berlinale, mas a presença de um diretor reconhecido, atores famosos e um tema com preocupação social, questão sempre presente em Berlim, seduziram seu diretor Dieter Kosslick.
Mesmo assim, além de belas imagens, há pouco sobre a África no filme, o eixo apontado por Kosslick como o principal do festival.
Espera-se "Hotel Ruanda", produção exibida hoje na mostra competitiva sobre o porteiro de um hotel, justifique melhor as idéias do diretor. Hoje, ainda participam da competitiva "Thumbsucker", de Mike Mills, e "Asylum", de David Mackenzie.
Ontem, à noite, seria exibido "O Redentor", do brasileiro Cláudio Torres, abrindo a sessão Panorama. São os únicos dois filmes do dia de inauguração do festival, com uma programação que chega a 400 produções, fora os eventos paralelos, como um festival de Arte e Performance, com a artista Janett Cardiff, além de uma performance do estilista japonês Yamamoto, sexta, dia 18.

O jornalista Fabio Cypriano viaja a convite da organização do festival

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