São Paulo, Quinta-feira, 11 de Março de 1999
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RELÂMPAGOS
Clarabóias

JOÃO GILBERTO NOLL

Lá, os defuntos eram velados em suas casas. Fui com meu pai ao velório de um vizinho. Duas da tarde. Janelas fechadas, velas, cheiro assoberbado de flores. Logo preferi o quintal da nova viúva. Nos fundos, num casebre, vivia seu cunhado. Um homem sem uma perna. Ele me chamou. Entrei. Resmungou que não choraria o irmão morto. O pé que lhe restava tinha as unhas cor de púrpura. Ele fechou a porta. Ouvi sua reza sem poder enxergá-lo. Falava em clarabóias no infinito. Olhei para cima: era, sim, uma clarabóia. Noite! Por sobre a lua passavam manchas azuladas. Uma estrela piscava. Concluí que não veria mais meu pai.


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