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São Paulo, sexta-feira, 11 de abril de 2003

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CINEMA/ESTRÉIA

No corredor da morte

Divulgação
Os atores Ivan de Almeida e Milhem Cortaz em cena de "Carandiru", de Hector Babenco; reconstituição do massacre de 111 presos ocupa 12 dos 146 minutos do filme



Hector Babenco lança mirada humanista sobre o massacre da Casa de Detenção de SP em "Carandiru"


SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL

O cineasta Hector Babenco, 57, faz o espectador de "Carandiru" -seu oitavo longa-metragem, que estréia hoje em 276 salas brasileiras- esperar pela cena do massacre. Deliberadamente.
"Não queria começar o filme com um crime, em torno do qual a história se desenvolve, pela investigação. Essa é uma estrutura manjada. Todo filme americano começa com um crime. Não sou o [diretor norte-americano Steven] Spielberg. Não vou fazer "O Resgate do Soldado Ryan". Ali morrem todos aqueles homens, mas você não sabe quem eles são. São mortes anônimas."
Para dar aos seus personagens um rosto e uma história, Babenco tomou seu tempo. O filme dura 146 minutos. Apenas 12 deles são ocupados pela reconstituição do episódio ocorrido em 2 de outubro de 1992, quando, enviada para conter um tumulto na Casa de Detenção de São Paulo, a tropa de choque da Polícia Militar invadiu o presídio e matou 111 detentos.
"Não interessa se foram 111 ou 117 ou 230 ou 44. Não estou fazendo um filme porque morreram 111 pessoas. Não é isso que me assusta. No último Carnaval, no Rio, morreram 90, em quatro dias. Isso está no jornal e na TV. O que assusta é a brutalidade do gesto, o ensandecimento histérico que tomou conta dos dois grupos -tanto dos presos como da polícia", diz o cineasta.
Até o ano passado, quando foi desativado e teve três de seus pavilhões implodidos, o complexo do Carandiru abrigava mais de 7.000 presidiários.
"Meu prumo é minha responsabilidade ética perante minha obra de arte. Não estou glorificando os bandidos. Não os estou vitimizando. Não estou dizendo se estão certos ou errados. Simplesmente estou mostrando que todas aquelas pessoas são pais, filhos, maridos de alguém", afirma o cineasta.
Se o espectador encarar os personagens de "Carandiru" pela mesma mirada humanista do diretor, Babenco acreditará que seu filme chegou ao topo do que o cinema pode aspirar no diálogo com o público.
"Que função social pode ser maior para um filme do que fazer com que o outro passe a ser compreendido por aquele que tem R$ 14 para ir a um cinema no shopping?", indaga.
"Hoje em dia, todo mundo tem uma explicação para a violência. Mas todas elas partem de um ponto de vista equivocado. A classe média, apavorada pela violência, não conhece aquele que ela chama de bandido. E o bandido conhece muito menos quem nós somos. São dois territórios de exclusão. Fui motivado [a fazer o filme] pela necessidade de mostrar essas pessoas da forma mais patente possível", diz Babenco.

Veja fotos, trailer e conheça os personagens do filme em www.folha.com.br/ilustrada


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