|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
LIVROS
Conflito entre editora e agente de Manuel Bandeira atrasa publicação de coletânea em Portugal
Nau de brasileiros sai desfalcada
EDUARDO SIMÕES
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma conflituosa negociação de
cifras e prazos de aprovação de
conteúdos, entre o agente literário
de Manuel Bandeira no Brasil, a
Solombra Books e a editora lisboeta Cotovia, atrasou em mais
de um mês o cronograma de lançamento simultâneo, em Portugal, dos quatro primeiros volumes da coletânea "Curso Breve de
Literatura Brasileira", composta
de 16. O projeto inicial era publicar, no volume 4, poemas de Bandeira na antologia "Seria uma Rima, Não Seria uma Solução"; e
seu livro de poemas "Libertinagem" deveria ter saído no volume
5, em maio.
De um lado, o diretor da Solombra, Alexandre Teixeira, diz que
os direitos de "Libertinagem" ainda estavam sendo negociados
quando a Cotovia passou a pressioná-lo para liberar também a
publicação da antologia, que seria
lançada antes. "Ninguém detona
um cronograma sem ter os contratos fechados, a não ser que tenha intenção de usar os prazos
como arma de pressão", diz Teixeira. Do outro, o organizador da
coletânea, Abel de Barros Baptista, professor de Literatura Brasileira da Universidade de Lisboa,
defende a editora ressaltando que,
em dez meses de negociação, Teixeira não demonstrou estar inclinado a não dar a autorização, ao
mesmo tempo em que condicionava a aprovação ao resultado final, a saber, capa e textos.
O conflito não se restringe a
prazos e conteúdos, mas leva em
conta as cifras, não reveladas, mas
que Baptista considera "exorbitantes". Teixeira, por sua vez,
lembra que os royalties seguem a
lei do mercado. "Tanto Bandeira
como Cecília Meireles [também
agenciada pela Solombra] percebem direitos diferenciados, pois
temos mais candidatos a publicar
do que podemos absorver", afirma o agente, que chegou a enviar
um contrato para "Libertinagem"
já assinado e pensava em concordar com os valores propostos pela
Cotovia até receber um e-mail da
editora estipulando 18 de maio
como prazo final para a liberação.
À espera de uma resolução para
o impasse, a Cotovia lançou nesta
semana três volumes: "Memórias
Póstumas de Brás Cubas", de Machado de Assis, uma antologia
com 25 de seus contos, e outra de
autores do Romantismo e Simbolismo brasileiros. A editora continuará colocando os demais tomos no mercado, mês a mês, esperando completá-la em abril de
2006. A coletânea traz obras de
mais de 60 autores do país, de
Gonçalves Dias, o mais antigo, até
novos escritores, reunidos nas antologias de poesia e conto dos volumes 13 e 15, cujos contratos ainda estão em negociação.
A seleção teve como critérios,
segundo Baptista, valorizar autores que trouxeram uma contribuição original para a literatura
internacional, como Machado de
Assis e Clarice Lispector, e outros
ainda não editados em Portugal.
Para ele, do ponto de vista crítico,
haverá boa recepção. "Do comercial, ainda é cedo para avaliar.
Mas estou convencido de que será
acima da média", estima o professor, contando com a venda de até
800 exemplares por volume, 80%
da tiragem. "Livros de poesia portuguesa vendem até 200 exemplares. Cinqüenta mil é para best-sellers como José Saramago. Se chegarmos até 2.000 será ótimo."
A exemplo do "Curso Breve",
um número crescente de lançamentos serve de termômetro da
recuperação da presença da literatura brasileira no mercado livreiro português. De acordo com
José Manuel Cortês, diretor do
Instituto Português de Livros e Bibliotecas, nas décadas de 40, 50 e
60, o interesse pela produção literária do Brasil foi razoável, mas
caiu nos anos seguintes. "Nos últimos tempos começou a haver um
reforço e a prova disso é que há
editoras apostando na publicação", avalia Cortês, citando a
Dom Quixote, a Campo de Letras
e a Relógio D'água como editoras
com publicação sistemática de
autores brasileiros em Portugal.
A Cotovia, que publica, entre
outros, Raduan Nassar, Chico
Buarque e Sérgio Sant'Anna, não
fica de fora da lista, observa Ray-Güde Mertin, agente literária alemã que levou ao mercado europeu obras de João Ubaldo Ribeiro
a Santiago Nazarian. "Há também
um selo da Editora ASA do Porto,
por onde já foram publicados alguns títulos e vão ser publicados
no decorrer deste ano e no futuro,
entre eles os colunistas da Folha
Fernando Bonassi e Carlos Heitor
Cony. Tenho acompanhado os altos e baixos deste intercâmbio há
anos e faço figa para que agora dê
certo", diz Mertin.
Neste panorama, o lançamento
de "Curso Breve" é considerado
uma iniciativa ambiciosa. "Nunca
houve nada de semelhante em
Portugal. As edições de literatura
brasileira foram sempre esparsas
e esporádicas. As coletâneas são
raras e muito especializadas, e há
décadas que não se fazem. Houve
uma de contos do Brasil, publicada em 1945, e uma antologia da
poesia brasileira contemporânea,
de Carlos Nejar, publicada nos
anos 80, defende Baptista. Cortês
assina embaixo: "De fato, um
conjunto de títulos que pretende
ser um guia das letras brasileiras
não existia e é novidade".
Enquanto isso, no Brasil, a editora com maior número de títulos
de Manuel Bandeira no mercado
é a Nova Fronteira, que publica o
autor desde os anos 80. São nove
títulos, seis deles antologias poéticas. O mais vendido é "Estrela da
Vida Inteira", com cerca de 200
mil exemplares. O último lançamento foi "Testamento de Passárgada", em agosto de 2004. A editora prevê para o segundo semestre uma reedição de "Berimbau".
Para Alexandre Teixeira, o mercado nacional é muito bem suprido de Manuel Bandeira. "Além de
um volume de crônicas recém-lançado pela Global e de uma antologia juvenil recém-lançada pela Moderna, temos já contratados
e ora em fase de programação editorial, para início de lançamento
no segundo semestre de 2005, onze títulos de autoria de Manuel
Bandeira", adianta o agente.
Texto Anterior: Cinema: Novo Asterix terá Van Damme e Alain Delon Próximo Texto: Literatura: Leopold Bloom dá novos passos em português Índice
|