São Paulo, Sexta-feira, 11 de Junho de 1999
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"AMORES" - ESTRÉIA
Oliveira se declara ao amor moderno

Divulgação
Os atores Vicente Barcellos e Clarice Niskier em cena de "Amores"


ERIKA SALLUM
da Reportagem Local

Uma certeza persegue o cineasta e escritor Domingos Oliveira desde criança. Se o cinema não existisse, sua vida seria pior. Muito pior.
Diretor do clássico "Todas as Mulheres do Mundo" (1966), dramaturgo e homem de teatro, Oliveira ficou 18 anos longe das telas. Seu retorno à sétima arte estréia hoje em São Paulo, com quase um ano de atraso: "Amores".
Rodado em três semanas e montado em duas, o filme faz, de forma simples, um retrato da vida contemporânea, urbana, em que todos, de uma certa maneira, enfrentam problemas de amor.
Vieira (Oliveira) é um escritor de TV e pai coruja às voltas com sua jovem filha (Maria Mariana, filha do diretor). Entre seus melhores amigos, está o casal Telma (Priscilla Rozenbaum, mulher de Oliveira há 18 anos) e Pedro (Ricardo Kosovski), que enfrenta crises no relacionamento. Há ainda um terceiro núcleo: Luiza (Clarice Niskier), uma atriz fracassada que se apaixona por um bissexual soropositivo (Vicente Barcellos).
"O amor hoje nos deixa perplexo. Os modelos de comportamento não existem mais. Se hoje você quiser casar com um poodle, a sociedade vai achar normal, não há mais regras. É a era da criatividade no amor", afirma Oliveira à Folha.
O roteiro é uma parceria de Oliveira e Priscilla e, antes de virar filme, se tornou peça, ficando em cartaz no Rio por um ano, praticamente com o mesmo elenco.
Parte das cenas foi rodada na própria casa do diretor, no Rio, que não esconde ser "Amores" um texto semibiográfico.
"É meio verdade e meio ficção, e a ficção é a alma do negócio. Escrevo sempre sobre mim mesmo. Estou absolutamente convencido da verdade formulada por Tchecov de que o único jeito de universalizar é particularizar. Todos os homens são iguais", diz Oliveira, que faz sua estréia na tela como ator.
Carioca de 62 anos, o cineasta começou no cinema como assistente de direção, "do tipo trazer sanduíche", de Joaquim Pedro de Andrade. Em sua estréia, com "Todas as Mulheres do Mundo", conta que não sabia nem quantas lentes tinha uma câmera. "Mas comecei a filmar e descobri que sei fazer cinema, sei contar histórias. Parei por 18 anos, mas cinema é como andar de bicicleta, nunca se esquece."
Fã de Woody Allen, Truffaut, Godard -admite que "Amores" tem influências diretas deles ("Há uma frase que diz: "Se pude olhar tão alto, é porque subi nos ombros de gigantes'")-, ressalta que está preocupado com o conteúdo, não com a forma.
"Sempre me pergunto o que o filme significa. E "Amores" é a história de gente que está com problemas sérios de amor. E que vão descobrindo soluções razoáveis para suas vidas porque se amam muito. É no próprio amor que você encontra saídas para essas dificuldades -se você tiver problemas de amor, ame mais. O amor é mestre, ele tudo sabe..."
Acrescenta ainda que a vida é "uma alternância de terrores e glórias". "O terror é imenso, seja o terror de ficar sozinho, não ser amado ou de morrer. Mas a glória da vida também. Parece-me que o terror já está muito dito. O moderno é você falar da glória, dos motivos que existem para se viver, da beleza da vida. Isso marca o filme e minha obra de um modo geral."
Com ar filosofal, afirma crer que arte não tem a ver com a morte. "Ela é uma propaganda da vida, é a vida sem as partes chatas." Diz isso para quem pensa ser "Amores" um trabalho otimista. "É apenas um filme que gosta da vida." Olha para o infinito e dá um sorriso vago...


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