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"WALTERCIO CALDAS"
A passagem do tempo como um fenômeno concreto
TIAGO MESQUITA
CRÍTICO DA FOLHA
Os livros sempre tiveram
papel característico na obra
de Waltercio Caldas. Longe de
atuar como um elemento marginal, acessório ou instituir um lugar onde o artista poderia ensaiar
a realização de outros trabalhos,
esses objetos foram enfrentados
como questão.
Os livros atuam no espaço e ressignificam as relações do espectador com o objeto e dele com o seu
entorno. Na sala de exposição, os
trabalhos com livros de Caldas
demonstram o mesmo estatuto
de suas esculturas, seus desenhos
e suas instalações.
Nesta retrospectiva na Pinacoteca do Estado é possível conferir
a extensão e variedade que o uso
deste objeto obteve na obra do artista carioca. Para falar de meios,
podemos ver os livros como suportes para espaços mais esculturais e trabalhos de feição mais
conceitual. Livros que parecem
falar curiosamente do que se passa em sua superfície e outros que
tratam da relação de uso que o espectador estabelece com ele.
Portanto, mesmo que existam
alguns volumes nesta exibição
que acabem reunindo obras de
outro tipo, como uma maneira de
sequenciar séries de trabalhos de
outras linguagens (como a foto e
o desenho), de modo geral eles
atuam como peças de arte.
E realizam essas operações
guardados em caixas de acrílico
que os isolam de outras atividades
da sala de exposição. Isolados, alguns objetos parecem se tornar
reflexivos, como se a distância do
espaço onde ele tem algum uso
enfatizasse algumas de suas propriedades físicas e culturais.
Waltercio parece se interessar,
sobretudo, pelo caráter reprodutível e analógico destes objetos.
Entre eles o valor literário não parece ter primazia -eles aparecem
dentro daquela caixa como um
recipiente de sinais gráficos impessoais que repõem sempre os
mesmos sentidos.
O artista olha com estranhamento a missão de clarividência
desses objetos gráficos. Tenta enfatizar o que há de insólito na
transposição simbólica de fenômenos distantes, que a princípio
não lhe dizem respeito.
Em alguns trabalhos o artista faz
desses vestígios uma obra outra.
Parece fazer coro com o Borges de
"Ficciones", que "não busca nem
a verdade, nem a verossimilhança, mas busca o assombro".
Em certo aspecto, as cúpulas de
acrílico na pinacoteca garantem
que esses livros sugiram as suas
formas de maneira mais fixa.
Por vezes , como em "Figura Figura", o uso de palavras impressas em contato com uma palpável
linha de lã parece nos dar a dimensão da possibilidade de criar
experiências fortes mesmo em
meio a um universo de mensagens que chegam aos nossos
olhos se desfazendo.
Aliás, desse ritmo efêmero tal
trabalho tira sua força. Quando
essas intervenções se valem dos
vestígios de uma presença, de
modo a fixar um comentário sobre a história da arte, o seu sentido é prejudicado. Parece ter mais
graça quando essas imagens que
dão sumiço à nossa experiência
anterior também se desfazem
diante de nós. Mas, desgarradas,
elas se oferecem para uma brincadeira que lhes dá presença. Nessas
fissuras, Waltercio Caldas torna
possível, em meio a uma série de
sensações impalpáveis, que sintamos a passagem do tempo como
um fenômeno concreto.
Waltercio Caldas
Onde: Pinacoteca do Estado (pça. da
Luz, 2, Bom Retiro, São Paulo, tel. 0/xx/
11/229-9844)
Quando: de ter. a dom., das 10h às
17h30; até 4/8
Quanto: entrada franca
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