|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ERIKA PALOMINO
Rodrigo Marques
|
A modelo Cassiane Bohn, novo rosto moderno do circuito |
O FUNK, O SEXO E A DEMOCRACIA DAS AREIAS
O trabalho de Bia Lessa foi a
sensação do terceiro dia do Fashion Rio. Ao misturar moda e
teatro, a diretora trouxe charme
ao desfile da Blue Man, na noite
de quarta. Estava tudo meio entorpecido. E Bia acordou os sentidos do público. A moda praia
vive essa questão de ter que se
reinventar. E, numa temporada
em que o tal "cofrinho" virou objeto de desejo, a repetição dos
modelos cria armadilhas. Bia
abriu com atrizes rasgando a
roupa, fez as modelos rodopiarem com areia de purpurina nas
mãos e acelerou batimentos cardíacos com um grupo de dançarinos de funk. Garotos negros de
sunga branca, popozudas de biquíni. Se os fashionistas não sabiam o que pensar, o público entendeu: foi tudo.
Folha - Como é a relação do teatro com a passarela?
Bia Lessa - Na verdade, o raciocínio é o mesmo. Mas aqui a sensação foi de uma ópera, e isso
deixa o trabalho bem interessante: falar dois minutos com um
grupo, depois conversar com outro grupo. Diversas pessoas de
lugares diferentes, esse contato é
muito bacana. Coloquei pontos
nas atrizes que desfilaram para
brincarmos mais na hora.
Folha - Como foi a brincadeira
com o funk carioca no desfile?
Lessa - O estilista David Azulay
faz moda para todo mundo, não
existe uma linha condutora. Nós
temos que valorizar cada pessoa
e exercitar o convívio com grupos diferentes, misturar o público. Na primeira vez em que fui a
um baile funk fiquei louca. Eles
têm só uma vitrolinha e botam 10
mil pessoas para dançar. É de
verdade. É superpopular, mas
também é sofisticado: fazer 10
mil pessoas dançarem não é para
qualquer um.
Folha - Como foi o processo criativo do desfile?
Lessa - Essa foi a primeira vez
em que dirigi um desfile, e isso
aconteceu porque me identifiquei com a coleção. Quis mostrar como é gostoso ficar sem
roupa, de biquíni, à vontade. A
única forma de mostrar isso era
colocando mulheres vestidas na
passarela. Vestir e depois arrebentar a roupa para passar essa
sensação gostosa de vestir biquíni. Trabalhei com contrastes.
TEM ROSTO MODERNO
NA PRAÇA
Depois de fazer 17 desfiles da
São Paulo Fashion Week, todo
mundo está prestando atenção
no rosto moderno e internacional de Cassiane Bohn, 18, da
agência Skin. Anteontem ela
abriu seu primeiro desfile, o da
Andrea Saletto. Pele muito
branca, lembra a belga Hanelore, mas com um olhar mais doce, quase romântico. Modelo há
um ano, Cassiane nasceu em
Feliz (RS) e começou por incentivo dos amigos. Olhava modelos como Gisele e achava que jamais chegaria lá. No começo do
ano passou uma temporada em
Nova York, onde fotografou para a "Vogue" América e Itália,
seus "trabalhos mais importantes até agora". Cassiane é simpática, sorridente e bem resolvida. E conseguiu terminar o colegial. Quer ser modelo "por
muito tempo" e gostaria de fazer algum trabalho voluntário:
"Queria ir para algum lugar da
África bem pobre e ajudar, trabalhar na ONU". Nas horas vagas ela ouve música eletrônica e
hip hop. Não usa make durante
o dia, come bem e toma muita
água. Cassiane é uma linda.
COMPLEXO B DÁ NOTAS
PARA MODELOS
Complexo B é uma querida grife no Rio. Agrada, com desfiles
simples, mas simpáticos. A grife
trouxe na quarta uma brincadeira sob o tema "Mister Brasil", um concurso do homem
mais bonito do Brasil. Os convidados recebem uma placa com
a inscrição "NOTA 10", alusão
aos concursos de beleza. E a
brincadeira dá o tom. Ao final,
Pedro Aguinaga, o eterno homem mais bonito do Brasil, entra e é aplaudido. Ele é tudo. É
um verão com boas estampas,
como as de figa, pirarucu e
Grande Otelo. Vão ser hit.
TRIBALISMO VIRA MODA
Marisa Monte vai virar moda
na temporada internacional do
prêt-à-porter. O estilista Narciso Rodriguez está fascinado pela cantora, que já é a inspiração
de sua próxima coleção, de verão 2004. O designer está aqui
no Rio e pediu um jantar de
apresentação ao amigo em comum Giovanni Bianco. O encontro rolou na noite de terça,
na pizzaria Capricciosa. Rodriguez vai se inspirar no gestual e
no jeito da cantora. Todos os assistentes dele já têm o DVD no
computador e decoraram os
Tribalistas.
O FASHION RIO É UMA FESTA
Com o atraso relativamente sob
controle (a Blue Man começou
45 minutos depois), o Fashion
Rio tem cara de festa. Com a entrada liberada, o programa é
mesmo ir ao evento e ficar por
ali. Com tanta gente circulando,
muitas vezes rola uma bela confusão de lugares. E o povo que
não tem nada a ver vai ocupando os lugares de quem está trabalhando e até os da primeira fila. O que também aconteceu na
São Paulo Fashion Week. Incrível o desprendimento das pessoas. É verdade que em Paris todo mundo pega o lugar de todo
mundo. Mas não os das duas
primeiras filas, onde se sabe que
estão as pessoas importantes. É
um dos problemas de uma cultura de moda incipiente. Aos
poucos, vai melhorando. Ao
menos está se falando de moda.
ALTA-COSTURA DE MAYRINK VEIGA
Abriu aqui na semana passada
uma mostra deliciosa, bem a cara de um programa paralelo ao
Fashion Rio. É a exposição dos
vestidos de alta-costura de Carmen Mayrink Veiga, na Casa de
Arte e Cultura Julieta de Serpa,
Praia do Flamengo, 340. São 67
roupas, em 12 salas decoradas
por ela mesma, cada uma com
um nome e uma trilha sonora
especial. Embaixo de cada peça
vem um comentário da absurda
Carmen, como o lugar em que
foi usado ou uma observação
própria. Os incríveis retratos
feitos com seu rosto também
tomam lugar na linda casa, e o
de Portinari merece atenção,
entre candelabros.
A maioria das roupas é de Givenchy e Saint Laurent, incluindo um terninho risca-de-giz da
famosa coleção de 1970 do estilista, que fica numa parte em
que é possível manusear as peças com luvinhas brancas. O
mais antigo é de 1960, e está
muito bem conservado. Sobre
um mantô de lã vermelha de Givenchy, ela comenta: "Creio
que jamais usei no Rio". De outro: "É superdesconfortável e
pesado". Mas que causou grande impacto a cada aparição.
A passagem pelo Oriente de
Carmen -e de Saint Laurent-
merece sala própria, e vem de lá
um dos vestidos mais bonitos,
estampado e bordado, de 1987.
De um vestido de Grès, ela fala:
"Anda sozinho pelo mundo". A
mostra traz também os croquis
dos estilistas e as amostras de
tecido, e muitos revelam preços
e a negociação dos valores. A
parte mais linda é a que tem um
Cardin de renda, preto, na sala
Le Bleu Royal. A parte de baixo
da casa traz fotos, álbuns e as
memórias de uma vida glamourosa e intensa, cheia de festas e
viagens. O adorável programa
se completa no salão de chá ou
no restaurante dos fundos da
casa, e é possível pensar em
tempos que não voltam mais.
Na moda e no mundo.
palomino@uol.com.br
www.erikapalomino.com.br
Texto Anterior: Música: The Cure executa maratona gótica Próximo Texto: Moda: Grifes injetam frescor no Fashion Rio Índice
|