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LIVRO LANÇAMENTO
Boyd inclui Brasil em "O Destino de Natalie X"
SYLVIA COLOMBO
de Londres
O escritor William Boyd, 47,
nunca esteve no
Brasil. Durante a
adolescência, passada em Gana, seu
país natal, Boyd entrou em contato com a música brasileira por
meio de um disco de Milton Nascimento e algumas gravações de
chorinho.
"Desde então, uma obsessão
com o Brasil e o estereótipo de
alegria e redenção que o país representa me acompanhou por toda a vida", disse Boyd, em entrevista à Folha.
Em seu mais novo livro, a coletânea de contos "O Destino de
Natalie X", que acaba de ser lançado no país pela editora Rocco,
Boyd incluiu uma história que
tem o Brasil como um cenário
utópico.
"Jamais Vi o Brasil" é o nome da
história de um taxista inglês e infeliz, o personagem Wesley
Bright, cuja única satisfação na vida é ouvir a música de Milton,
Wagner Tiso e João Gilberto.
Boyd, autor de "A Praia de Brazzaville" e "A Tarde Azul" atualmente está trabalhando num novo romance e prepara-se para a
estréia mundial de seu primeiro
filme como diretor ("The
Trench"), no próximo Festival de
Cinema de Edimburgo (Escócia),
que acontece em setembro.
Leia abaixo trechos da entrevista que o escritor ganense, que vive
em Londres e em Bergerac, cidade
ao sul da França, concedeu com
exclusividade à Folha.
Folha - O conto que dá o nome
ao livro ("O Destino de Natalie
X") é a história de um diretor
africano que vai parar na indústria do cinema do primeiro
mundo. O resultado é um problema de incompreensão mútua. É uma ironia quanto aos
atuais confrontos culturais?
William Boyd - Sim, queria
mostrar como a indústria cultural
consome a diversidade racial pelo
único fato de que passou a precisar dela nestes tempos de globalização. Mas, que, em nenhum momento, a compreendeu.
"O Destino de Natalie X" é um
conto sobre desencontros de
idéias artísticas, posições sociais e
raciais.
Folha - No conto "Jamais Vi o
Brasil", o personagem que se
apaixona pelo país, o taxista
Wesley Bright, tem alguma coisa de autobiográfico?
Boyd - Acho que na Europa, e
no resto do mundo em geral, o
Brasil é visto como um nirvana,
uma fantasia. Isso me tomou durante minha vivência européia.
Mas, ao lado desse estereótipo comum, carrego o Brasil que conheci ao ouvir música brasileira, chorinho, os mineiros do Clube da
Esquina.
Sou obcecado pelo Brasil desde
a adolescência. Nesse sentido, o
conto é autobiográfico, pois reflete esta minha obsessão.
Folha - Fale mais sobre a importância da obsessão na literatura.
Boyd - A literatura é fruto da
obsessão, nós elegemos nossos
ícones e referenciais.
A minha tem duas direções,
uma delas é o Brasil, outra é a poesia portuguesa e sua cultura literária em geral.
Folha - No conto "Cork" há um
poeta português que usa pseudônimos. Menção a Fernando
Pessoa?
Boyd - Exatamente, adoro a história de Pessoa e sua poesia. No
conto, o poeta português é bem
diferente de Pessoa, mas a paixão,
a latinidade e a ambiguidade da
cultura portuguesa estão ali.
Folha - Vamos continuar com
as obsessões. Nesse livro, a
maioria dos contos tem um protagonista estrangeiro. Por quê?
Boyd - Acho que nenhum escritor consegue separar sua experiência própria de sua obra. Eu
não consigo imaginar lugares ou
situações muito diferentes das
que vi e vivi.
Nasci em Gana, passei boa parte
da minha juventude na Nigéria e,
em seguida, fui estudar em Nice
(França), Glasgow (Escócia) e Oxford (Inglaterra). Passei a maior
parte de minha vida como um estrangeiro. Acho que toda a minha
obra foi criada sob um ponto de
vista estrangeiro.
Folha - Qual é sua ligação com
a África, hoje?
Boyd - Estive na Nigéria há alguns anos numa campanha de direitos humanos. Tinha um grande amigo lá, um escritor chamado
Ken Saro-Wiwa, que foi morto
por sua atividade política. Fiquei
algum tempo por ali, participando de manifestações e campanhas. Acho que o continente todo
está mudando rápido, crescendo,
mas acho que o desrespeito aos
direitos humanos é cada vez mais
grave.
Folha - "A Good Man in Africa", seu primeiro romance, assim como outras sete histórias
suas, foram levadas para as telas. Escrever histórias ricas em
imagens é uma preocupação
sua?
Boyd - Não escrevo livros pensando em filmá-los. Acho que a
preocupação com as imagens faz
parte do meu estilo. Também não
acho isso muito original.
Toda a geração literária pós-Segunda Guerra tem essa característica, que está relacionada com o
momento que os meios de comunicação vivem atualmente.
Folha - Essa é sua segunda coletânea de contos, você prefere
escrever romances?
Boyd - Sim, sou um escritor de
romances. Mas acho que as histórias curtas tem uma função muito
especial para um contador de histórias que é a de oferecer um formato em que é possível experimentar.
Quando falo isso, quero dizer
experimentar num sentido amplo, não apenas quanto às palavras, mas quanto às sensações dos
personagens e à emoção do leitor.
Livro: O Destino de Natalie X
Autor: William Boyd
Lançamento: Rocco
Quanto: R$ 22 (164 págs.)
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