São Paulo, sexta, 11 de setembro de 1998

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O soldado Ryan celebra a identidade perdida dos EUA

RONALD STEEL
da "The New Republic"

Apesar de explorar o horror da guerra, "O Resgate do Soldado Ryan" é uma celebração do orgulho e patriotismo nacionais.
Antigamente o patriotismo andava de mãos dadas com a cidadania e a identidade cultural. Os americanos eram originários de todas as partes do planeta, mas procuravam fundir aquilo que haviam sido anteriormente com a nova cultura em que ingressavam. Ser americano significava não apenas possuir um passaporte americano, mas compartilhar identidade cultural e lealdade política.
Hoje, para muitas pessoas, essa idéia soa antiquada. Essa mudança não se deve a uma causa única. Entre elas, se destacam a imigração, o multiculturalismo, globalização.
Mas o efeito cumulativo desses fatores tem sido o de solapar o alicerce de coesão e identidade nacional. E, como resultado, os EUA podem estar se transformando na primeira sociedade pós-nacional.
De cada dez pessoas que vivem no país, uma nasceu em outro país. O que torna as estatísticas significativas, nesse caso, não é tanto o número de imigrantes, nem mesmo sua natureza, mas o contexto no qual essa imigração se dá.
Esse contexto é dominado pelo fenômeno ao qual chamamos multiculturalismo -ele rejeita o conceito de uma cultura americana única. Ao enfatizar as partes, ele desvaloriza e macula o todo.
Na medida em que o multiculturalismo encoraja as pessoas a se orgulharem de suas origens étnicas, ele pode enriquecer a nação. Mas, ao celebrar as diferenças, pode transformá-las em barreiras.
Hoje a cidadania americana é muito mais fácil de se conseguir e difícil de se perder do que era antigamente. A maioria dos países com grande número de imigrantes nos Estados Unidos hoje permite e até incentiva a dupla cidadania. Com isso, as fronteiras e as barreiras parecem antiquadas.
Enquanto isso, a globalização, ao mesmo tempo que elimina o tempo, a distância, as fronteiras e as identidades de empresas, exerce um efeito profundo sobre as lealdades culturais e políticas dos cidadãos nascidos nos EUA.
Talvez seja esse o rumo que o mundo está seguindo. Talvez os EUA sejam o primeiro país a ingressar no mundo do século 21: um mundo sem barreiras, sem bandeiras, sem heróis e sem lealdades.
Talvez não importe que está se tornando mais difícil para nós definirmos quem somos, enquanto povo, no que acreditamos e pelo que estaríamos dispostos a lutar. E, se isso for verdade, talvez seja por esse motivo que os americanos, este mês, estão celebrando o humilde soldado Ryan -por nos fazer lembrar que houve uma época em que isso era importante.
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Tradução Clara Allain



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