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FESTIVAIS
Drama situado na Itália é favorito em Veneza
AMIR LABAKI
enviado especial a Veneza
O drama italiano "Cosi Ridevano" (Assim Riam), de Gianni
Amelio, tornou-se ontem o grande
favorito ao Leão de Ouro da 55ª
Mostra Internacional de Arte Cinematográfica de Veneza.
É, até o momento, neste penúltimo dia da competição, o único
concorrente a combinar a originalidade e a majestade dos dignos
vencedores dos grandes festivais.
Não se trata de um filme perfeito,
sobretudo em seu final, mas obras-primas também têm defeitos.
"Cosi Ridevano" traz uma visão
crua, densa, elíptica sobre quatro
anos da vida de dois irmãos pobres
da Itália na virada dos anos 60.
Amelio, que esteve no Brasil há
dois anos como jurado da Mostra
Internacional de Cinema de São
Paulo, mais uma vez enfoca personagens que buscam uma nova vida
por meio do movimento.
Era assim com "Ladrão de Crianças" (1992), Grande Prêmio do Júri
em Cannes, e na saga albanesa "Lamerica -Tempo de Chegar" (1994),
que lhe valeu aqui a Osella de diretor.
Em "Cosi Ridevano", os irmãos
Giovanni e Pietro partem da Sicília
para Turim. Vão lutar pela sobrevivência. O mais velho, Giovanni
(Enrico Lo Verso), planeja trabalhar, mesmo analfabeto, para sustentar os estudos do caçula. Pietro
(o estreante Francesco Giuffrida)
não vai se render facilmente à estratégia traçada.
Os romances sociais de Dickens
("David Copperfield") e Steinbeck
("As Vinhas da Ira") são as referências literárias mais óbvias. No
cinema, o amargo "Cosi Ridevano" parece o estranho cruzamento
entre "Rocco e Seus Irmãos"
(1960), de Lucchino Visconti, e
"Ironweed" (1987), do aqui jurado
Hector Babenco.
O filme se estrutura em seis capítulos de ritmo lento, cada um dedicado a um dia do ano, de 1958 a
1962. Em "Chegadas", o mito do
sucesso fácil na cidade grande desmorona logo no desembarque dos
irmãos.
"Enganos" revela a teia de pequenas traições montada sob a relação deles. A ascensão de Giovanni no submundo é o centro de "Dinheiro".
Em "Cartas", o projeto de Giovanni parece em curto-circuito
com o desaparecimento do irmão.
"Sangue" apresenta o teste supremo de solidariedade entre eles. Por
fim, o estranhíssimo "Famílias"
vai revelando aos poucos como ficaram os sonhos de Giovanni e seu
irmão.
Não há equilíbrio total entre os
episódios. Os dois centrais, "Dinheiro" e "Cartas", arrastam-se
um pouco, arrefecendo a tensão. O
filme poderia durar algo menos
que suas duas horas e quatro minutos. Mereceria ainda uma conclusão mais contundente. Amelio
a esboça, devolvendo os personagens à estação de trem onde tudo
começou, mas a deixa escapar pelos dedos.
Ainda assim, apenas "Black Cat,
White Cat" (Gato Preto, Gato
Branco), de Emir Kusturica, parece capaz de roubar o Leão de Ouro
de Gianni Amelio. Os demais concorrentes dos últimos dias sequer
deveriam estar no páreo.
Todos os clichês da Irlanda se
amontoam em "Dancing at Lughnasa", de Pat O'Connor, que permite a uma perdida Meryl Streep
exercitar mais um sotaque. "Terminus Paradis" (Estação Final, Paraíso), do romeno Lucian Pintilie,
é um instantâneo caótico do caos
no Leste Europeu pós-socialista.
Nada supera em picaretagem,
porém, "New Rose Hotel", de Abel
Ferrara, um thriller "high-tech"
adaptado de William Gibson.
Christopher Walken e William Dafoe recorrem à prostituta Asia Argento para conseguir o passe de
um cientista de gênio. Ferrara rodou meio filme, reciclou monotonamente as mesmas imagens pelo
resto do tempo e embolsou a diferença. É o escândalo do ano.
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