|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
RELÂMPAGOS
Mucosas
JOÃO GILBERTO NOLL
Estavas em coma aquela
noite. Bati na vidraça do teu
quarto esperando que me
acolhesses com a lareira acesa, mas te vi na cama, a cabeça
meio pra trás, lembrando vagamente a máscara mortuária de uma figura guarani;
não parecias respirar, na certa
tinhas bebido até cair, até
chegar ao submundo mental,
ao turismo pelos cemitérios
de neurônios. Voltavas depois pra mim tão sem pistas,
que perguntavas teu nome,
tua procedência e tudo. Estavas em coma. Tanto, que quebrei o vidro com o punho e
entrei. Sangrava minha mão.
Vi que não havia o que fazer.
Já tinhas certa lividez laqueada e só me restava te velar. Foi
o que fiz? Não, não foi: deitei
sobre o teu corpo e abandonei a língua na tua boca até
clarear não só o dia, mas também a idéia de te incinerar.
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Literatura: Norman Mailer volta a ser cotado ao Nobel Índice
|