São Paulo, quinta-feira, 11 de outubro de 2001

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TEATRO

Estréia em SP quarta peça de Dionisio Neto, que segue estrutura linear e está repleta de citações visuais e sonoras

"Antiga" quer desmontar as aparências

VALMIR SANTOS
FREE-LANCE PARA A FOLHA

As aparências enganam, mas, enfim, aparecem. Os atalhos poéticos do paranaense Paulo Leminski podem servir de pista para a nova peça do diretor e ator maranhense Dionisio Neto.
Em "Antiga - A Milagrosa História da Imagem que Perdeu Seu Herói", que entra em cartaz hoje no Centro Cultural São Paulo, Dionisio desconstrói, aos poucos, as máscaras do que ele define como uma "família-frankenstein".
Numa metrópole contemporânea, um magnata das comunicações, sua mulher reclusa, garimpada no sertão baiano, sua filha adotiva, moldada nos padrões da moda, e um rapaz da periferia, que usa a "arte de pichar" como arma para conquistar seu lugar ao sol, compõem os desvãos de um labirinto que culmina em uma festa de Réveillon.
"São personagens arquétipos, inspirados na alta roda paulistana e na cultura marginal, que podem ser encontrados em qualquer festa, em qualquer esquina", afirma Dionisio Neto.
Em cena, ele interpreta Capricórnio, uma espécie de "terrorista-poeta" que sonha invadir o Museu de Arte de São Paulo, o Masp, para pichar versos seus e ganhar as manchetes dos jornais.
"Toda a trajetória pessoal dele é a de um "outsider" consciente, lembra um Marcelo D2, um Chico Science, um Renato Russo, enfim, a nossa geração perdida", continua Dionisio, que já trabalhou com José Celso Martinez Corrêa e Antunes Filho.
A nova peça diz respeito não só aos filhos sem norte, mas também aos pais, daí a perspectiva de um núcleo familiar.
O mentor é Vittorio (José Rubens Chachá), homem das comunicações, "espécie de Assis Chateaubriand, de Cidadão Kane dos trópicos", fascinado pelo poder, pela modernidade (na peça, ele inclusive é amigo de Hélio Oiticica) e postulante ao cargo de presidente da República.
"O que me fascina no personagem é a possibilidade de mostrar os homens públicos que sabemos se tratar de grandes escrotos. No entanto são filtrados por um verniz que a mídia passa", diz Chachá, cuja bagagem inclui trabalhos da verve comediante do grupo Ornitorrinco, de Cacá Rosset.
Musa do cinema novo, Helena Ignez interpreta a mãe, Crista, que suporta um casamento de 12 anos. Segundo a atriz, trata-se de "uma diva idosa, charmosa e reclusa, sertaneja "desradicada" à procura de suas raízes, nem que seja por meio dos sonhos".
"Antiga" promove nova reunião no palco de Helena e sua filha, Djin Sganzerla, que interpreta Gertrúria. Elas atuaram no início do ano, no mesmo Centro Cultural São Paulo, em "Savannah Bay", de Marguerite Duras, dirigida por Rogério Sganzerla.
"A modelo Gertrúria também é usada pelo pai, Vittorio, como uma forma de atrair a mídia", afirma Djin. A personagem conhece Capricórnio em uma rave. Ela se apaixona, mas também estabelece com ele uma relação de poder de classes.
Em sua quarta peça, depois da "trilogia do rebento" ("Perpétua", "Desembest@i" e "Opus Profundum"), Dionisio afirma que se apropriou de uma forma clássica para escrever o texto, uma história com início, meio e fim, que se passa em quatro espaços cênicos diferentes.
Estão lá as fragmentações, as citações (os cineastas Glauber Rocha, com quem Helena foi casada, e o italiano Michelangelo Antonioni), a banda de garagem tocando ao vivo, uma trilha eclética (DJ Noizyman, Stockhausen, Villa-Lobos).
Outro elemento recorrente no teatro de Dionisio Neto, o vídeo, surge em "Antiga" como personagem, "contracenando" com os atores.
Os figurinos são assinados pelo estilista Reinaldo Lourenço. A cenografia é de Loira, e a iluminação, de Silvia Godoy.
Sobre o título, "Antiga", Dionisio afirma querer estabelecer correspondência entre os tempos do passado e do futuro no mundo contemporâneo que celebra o descartável.


ANTIGA - Onde: Centro Cultural São Paulo - sala Adhemar Guerra (r. Vergueiro, 1.000, Paraíso, SP, tel. 0/xx/ 11/ 3277-3611). Quando: estréia hoje, às 20h30; de qua. a sáb., às 20h30; dom., às 19h30. Quanto: R$ 12. Até 22/12.


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