São Paulo, quinta-feira, 11 de novembro de 2004

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LITERATURA

Livro do poeta (e em breve contista) Paulo Henriques Britto levou os R$ 100 mil do prêmio Portugal Telecom

"Macau" vira poesia mais valiosa das letras brasileiras

CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL

É um livrinho de capa prateada, de breves 80 páginas, batizado em homenagem a uma ilhota de português no meio da China: "Macau". É um livrinho de poemas com nomes como "Biodiversidade", "De Vulgari Eloquentia" e "Súcubo". Era um livrinho de um poeta chamado Paulo Henriques Britto brigando com obras de nomões como Augusto de Campos, Décio Pignatari, Manoel de Barros, Sérgio Sant'Anna e Chico Buarque, e com as novas estrelas literárias Bernardo Carvalho e Marcelo Mirisola.
E, de repente, não mais que de repente, virou um dos livros de poesias mais valiosos da história da literatura brasileira. "Macau" ganhou na noite de terça-feira o prêmio Portugal Telecom, o mais rico das letras nacionais. Paulo Henriques Britto saiu da festa na Sala São Paulo com um troféu e um cheque de R$ 100 mil.
Não foi curta a alquimia do livrinho prateado em pote de ouro. Resultado de anos de produção poética do carioca de 53 anos, que diz que escreve três ou quatro poemas por ano ("Em um ano ótimo faço seis"), "Macau" deu as caras no fim de 2003, lançado por uma editora sem tradição em poetas brasileiros de pouca projeção, a Companhia das Letras.
A primeira barragem ultrapassada pelo livrinho foi em fevereiro. Uma manada de críticos, jornalistas e professores de todo o país, 213 no total, indicaram os livros que acreditavam os melhores de 2003. "Macau" ficou em lista com outros mais de 500 títulos lançados no ano que passou.
Depois veio a escolha de um "Júri Nacional" com 20 votantes, em julho, de um "Júri Final", em agosto, e da lista de dez finalistas.
Anteontem de manhã, uma dezena de críticos de cinco Estados fez a eleição final, com votos individuais e secretos. "Macau" ganhou dez "xizinhos", quatro deles como o melhor livro do ano, e Henriques Britto levou a centena de milhar de reais, deixando Sérgio Sant'Anna em 2º (também com dez votos) e, surpresa 2, Luiz Antonio de Assis Brasil, em 3º.
Nos corredores da Sala São Paulo, menos cheia do que na primeira edição (que premiou a dobradinha Dalton Trevisan e Bernardo Carvalho, dois homens da prosa), os convidados se perguntavam: "Mas quem é esse Henriques?".
A surpresa não era geral. Pouco conhecido do grande público (do médio e pequeno também), o premiado tem prestígio no alto mundinho literário, seja por seus econômicos versos (só publicados em quatro livros), seja pelas aulas que dá na PUC carioca, seja pela extensa carreira como tradutor da língua inglesa, ramo em que é tido como o "número 1" no país.
Henriques Britto estava, por coincidência, para mostrar este mês uma quarta faceta literária. Com "Paraísos Artificiais", que deve sair entre o final de novembro e o começo de dezembro, também pela Companhia das Letras, ele se lançará como contista.
Assim como nos versos, é uma prosa que vem de longe, à conta gotas. O escritor diz que começou a escrevê-los em 1972, quando foi estudar cinema na Califórnia. Lá, e então, foi que decidiu que gostava era de literatura. Mas logo trocou a prosa pela poesia.
A primeira coletânea de narrativas curtas, com título "roubado de Baudelaire", terá textos ainda desta velha safra, mesclados com contos que fez aos poucos desde então, sempre de olho (em poesia ou prosa) no coloquialismo. Um poema à esmo de "Macau" exemplifica: "A tarde devora o dia/que já estrebucha entre nuvens./É noite./ Manhã engole essa noite/encaroçada de estrelas. É dia". Assim diz Henriques Britto, o homem que engoliu a noite.


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