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RELÂMPAGOS
Premente
JOÃO GILBERTO NOLL
Ela poderia responder à repentina necessidade de ação,
antes que a fome a obrigasse a
se postar diante da geladeira.
Antes disso, poderia escrever
a carta cujo destinatário estava prestes a se definir, poderia
umedecer a pele, cantar. Só
quando a fome viesse a lhe
enrijecer as mandíbulas, se isso de fato pudesse acontecer,
só aí ela esqueceria sua amada
atividade para se dedicar a
pôr nutrientes para dentro de
si. Por enquanto, a fome ainda era uma presença encabulada. A moça faria tudo para
esquecer que o corpo estava
muito assiduamente à sua espera para se refazer. Agora
pegaria o alaúde raro. Ou lavaria o vestido com a mancha
segredada. E não engoliria
nem um único farelo. Só, só
essa água que pinga pelo peito antes que, afoita, ela corra
para começar...
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